terça-feira, 30 de setembro de 2008

Assentamentos do Incra lideram desmatamento na Amazônia



29/09/2008
Local: Brasília - DF
Fonte: Radiobrás
Link: http://www.radiobras.gov.br

Luana Lourenço

Os assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) lideram a lista dos 100 maiores desmatadores da Amazônia, divulgada hoje (29) pelo Ministério do Meio Ambiente. As seis primeiras posições do ranking, que classificou os desmatadores pelo tamanho da área derrubada, são de assentamentos de reforma agrária, todos no estado de Mato Grosso.
Juntos, os assentamentos do Incra foram responsáveis por mais de 220 mil hectares de devastação da Amazônia, área equivalente a 220 mil campos de futebol.
Entre as propriedades particulares, o maior desmatador é o produtor Léo Andrade Gomes. De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ele é responsável por 12,5 mil hectares de destruição de floresta nativa sem autorização dos órgãos ambientais no município paraense de Santa Maria das Barreiras. O nome do produtor também aparece na lista pela destruição de mais 2,6 mil hectares da reserva legal de outra propriedade, em Santana do Araguaia, também no Pará.
Na comparação por estados, Mato Grosso reúne o maior número de desmatadores listados pelo Ibama, 50 dos 100. O Pará está em segundo lugar, com 37 campeões de desmatamento, seguido por Rondônia, com 7. Quatro outros produtores citados são do Amazonas, um de Roraima e um do Acre.
De acordo com o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o objetivo agora é realizar uma ação conjunta do MMA com o Ministério Público Federal (MPF) e a Advocacia-Geral da União (AGU) para abrir processos contra os 100 maiores desmatadores.


Via Amazônia

Canaviais crescendo em São Paulo



Cristiane Prizibisczki
26/09/2008, 17:58

A produção brasileira de cana-de-açúcar dobrará na próxima década, passando das atuais 480 milhões de toneladas por ano para um bilhão de toneladas, em 2020. Esse salto não será obtido somente com ganhos em eficiência, mas principalmente pelo maior uso da terra. Segundo a União da Indústria de Cana de Açúcar (Única), a cultura ocupa hoje cerca de sete milhões de hectares e a expectativa é de que essa área dobre na próxima década.

Aproximadamente 90% da produção nacional se concentra no Centro-Sul, principalmente em áreas de Cerrado e Mata Atlântica do estado de São Paulo. Segundo a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SMA), os canaviais, que há dez anos respondiam por menos da metade do espaço ocupado por lavouras no território paulista, hoje se espalham por quase 70% da área plantada, excluindo pastagens.


A matéria continua no O ECO

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Das Mentes Flexibilizadas (Ponto de bifurcação), artigo de Lucia Maria Paleari

JC e-mail 3367, de 10 de Outubro de 2007.
33. Das Mentes Flexibilizadas (Ponto de bifurcação), artigo de Lucia Maria Paleari

Será que os incautos fazendeiros, ávidos de lucros incomensuráveis, estão à espera de que nossas células venham um dia usar etanol, ao invés da preciosa água, em suas cadeias metabólicas que geram a energia que nos mantêm vivos?

Lucia Maria Paleari é professora do Departamento de Educação do Instituto de Biociências da Unesp. Artigo enviado pelo “JC e-mail”:

Vivemos tempos de assombro, de arbitrariedades, de imoralidades em todos os segmentos sociais. Em cada qual, características peculiares e diferentes graus de sofisticação comportamental, mas que traduzem uma só realidade: perdemos a dignidade humana e sucumbimos à corrupção, ao individualismo, à hipocrisia.

São estas ferramentas e armas do cotidiano, que fazem flamejar aviões mergulhados nos gritos desesperados de 199 vítimas conhecidas. São essas mesmas ferramentas e armas do cotidiano, que fazem flamejar o índio que repousa ao relento. São essas mesmas ferramentas e armas do cotidiano, que fazem flamejar o coração dos excluídos.

O Homo demens economicus racionaliza, se justifica e segue na empreitada de investimentos contra a vida, amparado pela consciência flexibilizada que lhe garante, senão o perdão, vista grossa à falta de observância das responsabilidades, dos imprescindíveis limites e cumprimento de normas, indispensáveis à boa saúde social.

Consciência flexibilizada que em lugar das penas cabíveis respalda as transgressões e insanidade, por meio de equivalente despudor e imoralidade, atitude que serve como alento nos, talvez raros, possíveis lampejos de decência e desassossego, que a solidão tem por capricho despertar.

Hoje, a virtude confunde-se com o mal, e a retidão de caráter e a sinceridade, ameaçam. Exercita-se o pacto do biltre: cada um por si e todos pela derrocada humana e do planeta.

As cenas se multiplicam, diversificam e traduzem sempre a mesma realidade cruel. Como cruéis, perversos, foram os rapazes desocupados e inúteis, que perambulando de carro pela madrugada à procura do nada, se depararam com uma mulher.

Imagem inversa, reversa, o avesso desses covardes, até então desconhecidos, que a agrediram. Segundo um dos pais dos agressores, “crianças que fazem faculdade” e que, por isso, não deveriam sequer ficar detidas em uma delegacia. Essas “crianças”, com palavras e atitudes nada ingênuas, demonstraram ter incorporado os padrões de conduta de quem usa do dinheiro farto para garantir a impunidade.

Impunidade que alimenta o tráfico de drogas, a brutal desigualdade social, o silêncio dos oprimidos, o desmatamento da Amazônia, da floresta Atlântica, do Cerrado, da Caatinga, os assassinatos dos pacifistas, os humanos abjetos, os mesquinhos sorrateiros, os ganhos ilícitos, o trabalhador usurpado, o dinheiro público mal utilizado e desviado, o professor humilhado, o aluno agressor, os rios poluídos, os políticos corruptos, as obras públicas inacabadas e superfaturadas, a prescrição de crimes, os aviões avariados voando, as pistas inacabadas operando, a indignação, desespero e lágrimas dos impotentes, a desesperança daqueles que do bem fizeram seu baluarte.

Contudo, a ordem é dialogar, negociar, flexibilizar. Grau e natureza dependem dos interesses, das conveniências. Conveniências que encarecem os investimentos em artimanhas, exacerbam as incoerências, miopia e cinismo humanos, e fazem da democracia o estado de direito do indivíduo, do mais forte, do mais sagaz, jamais da coletividade, que requer partilha, solidariedade.

Resta-nos saber se o Homo demens economicus já é suficientemente habilis para flexibilizar a morte, ou, simplesmente, para não sucumbir nos seus próprios dejetos.

Dejetos que não reconhecem barreiras geopolíticas e precipitam mudanças globais a enfurecer oceanos, fazer desaparecer ilhas e praias, arrastar casas e Homens, plantas e bichos, de forma implacável. Gaia, ferida de morte, explode dor, impõe o caos. Escancara-nos a nossa própria finitude onto e filogenética.

A insensatez humana é tão bárbara que para aumentar a área de plantio de cana em alguns metros quadrados, fazendeiros ordenam a empregados que, encobertos pelo manto escuro da noite, derrubem e enterrem as matas de galeria (matas ciliares) que deveriam proteger os mananciais.

Ordenam que o olho d’água, atrevido de brotar em meio ao canavial, seja soterrado, porque não facilita a passagem de máquinas que carregam a colheita.

Não bastassem imensas áreas de terrenos nobres de terra roxa tomados por cultura pouco exigente, e capaz de depauperar o solo a ponto de nem mesmo servir ao plantio do pasto, ainda nos obrigam a conviver com a poluição atmosférica, a qual agrava os quadros de doenças pulmonares, e a destruição dos microorganismos responsáveis pela ciclagem dos nutrientes do solo.

Dois dos problemas gerados pelas queimadas, que acontecem durante a época seca dos anos, para conveniência dos plantadores que gastam menos com as colheitas não mecanizadas. As chaminés além de jogarem na atmosfera grumos densos de fumaça, dissipam o ar malcheiroso e ambos denigrem a paisagem, denigrem a vida.

Tudo isso, sem contabilizar as mortes por exaustão de muitos cortadores de cana que, analfabetos e arrebanhados em zonas de pobreza, submetem-se a uma aviltante condição de exploração, espoliação, na tentativa de sobreviver. Serviço terceirizado, como tantos outros nesta sociedade de Pilatos. Mais uma artimanha a legitimar os ganhos, e as violências, que os empresários insistem em ignorar.

Será que os incautos fazendeiros, ávidos de lucros incomensuráveis, estão à espera de que nossas células venham um dia usar etanol, ao invés da preciosa água, em suas cadeias metabólicas que geram a energia que nos mantêm vivos?

Pior é que muitos fazem coro e alardeiam mundo afora as vantagens e possibilidades de crescimento econômico proporcionados por essa dita “energia limpa” dos biodiesel, com poucos opositores a contra-argumentar assertivamente.

Enquanto isso, o Cerrado e o Pantanal, locais de importância vital, residência de rica flora e fauna, fontes de água, fármacos, produtos alimentícios e artesanais de inestimáveis valores culturais, sucumbem à invasão da soja.

Monocultura que avança com migrantes, cujas práticas de agricultura já poluíram solo e água em suas regiões de origem, devido ao excesso de adubo e venenos químicos e colocaram por terra, graças à mecanização pesada, extensas áreas de florestas nativas, que não saciaram seus anseios de riqueza.

Ganância na busca de lucros, crescentes e imediatos, que encontra nas exportações o mercado dos sonhos, a proporcionar o acúmulo de capital, a aquisição de caminhonetes de luxo, de maquinários novos para expansões da lavoura e, conseqüentemente, de mais ganhos, salvo quando a variação de câmbio torna-se desfavorável.

E aí o despudor é tamanho que não hesitam em pedir subsídios governamentais ou o perdão pelas dívidas com financiamentos.

Agora, com a perspectiva criada pelo biodiesel, o leite falta e atinge preços proibitivos para que chegue às bocas. O milho que alimentava o gado, as galinhas e porcos é desviado para alimentar usinas produtoras de combustíveis para mover carros poluidores do ar, que tanto encantam e escravizam os brasileiros surpreendidos com o alto preço também da carne e dos ovos.

Será que a fé na ciência ainda é tanta que todos esperam, e para futuro próximo, que possamos substituir alimento por papel-moeda e água por biodiesel? Utilizamo-nos por tanto tempo da metáfora da máquina, que hoje parece líquido e certo que somos uma. Não o somos.

E o que dizer de pesquisadores empreendedores encastelados nas Universidades? Será que avaliam com propriedade e profundidade o papel que deveriam exercer nessa sociedade?

Ou em seus laboratórios e salas de aula também flexibilizaram e adaptaram o discurso que ameniza e justifica aceitar empresas financiadoras, irresponsabilidades, inoperância, favorecimento ilícito e assédio moral?

Serão esses especialistas autoridades ou apenas técnicos a manipular moléculas, situações e pessoas, como forma de manter o pequeno poder e garantir benesses e financiamentos oportunistas, como acontece em outros segmentos sociais?

Será que viagens e encontros técno-científicos patrocinados por multinacionais, digamos, bem intencionadas, também já foram flexibilizados e não mais causam repúdio e indignação?

Se tamanha flexibilização tomou espaço, como sair do vício e fazer da Universidade um lugar eminentemente de ciência, de livre pensar, e não mera fonte de empregos e diplomas a garantir ascensão social e celas especiais?

Ascensão social essa que tem se traduzido apenas em possibilidade de ganho, e assiduidade a centros de compras nacionais e internacionais para em consumo desmedido.

Sabemos que esta condição, somada ao descontrolado crescimento populacional humano, tende a exaurir o planeta e, em um círculo vicioso, potencializar todas as cadeias de retroalimentação, que culminam em brutal e imoral diferença social. Diferença social em primeira instância, que poderá ser seguida da extinção humana, que se antevê nos apelos de uma Gaia doente, que Lovelock tão bem caracterizou em seu livro mais recente.

É patente e imperativo procedermos a mudanças. Mudanças que nos elevem e nos levem a transcender as mazelas, como sugere a proposta valorosa de investirmos na educação integral do Homem, em sintonia com o antigo anseio de compreendermo-nos neste planeta e no universo, empreitada que resultou no maior empreendimento humano, a Ciência.

Uma proposta educativa que preconiza o espírito científico, o conhecer especialista aprimorado para compreensões contextualizadas das questões, a aceitação e o autoconhecimento na interação com o outro, como os pilares para o renascimento humano no Homo sui transcendentalis.

Um aprender para a vida e a vida inteira, em diálogo constante e profundo intra e interpessoalmente e com toda a Natureza, que sem a sinceridade, responsabilidade e comprometimento do Homem com o seu bem estar e de toda a coletividade, não proporcionará o renascimento desejável e necessário.

Por isso, em dado ponto de bifurcação, o rumo a ser tomado pelo sistema certamente não nos favorecerá como espécie, se insistirmos na cegueira de conveniências sociais individualistas, amparadas na hipocrisia das mentes flexibilizadas.

Via Jornal da Ciência

domingo, 21 de setembro de 2008

Racismo branco renasce com indústria cosmética na África e na Ásia



Artigo do jornal espanhol El País, traduzido e publicado na Folha de São Paulo




A herança pós-colonial renasce: os branqueadores de pele e as operações para arredondar traços faciais triunfam na Ásia e na África



Por Lali Cambra e Ana G. Rojas

A promessa é clarear a pele um ou dois ou três tons. Milhões de mulheres - e cada vez mais homens - de todo o mundo transformaram os cremes que dizem branquear a pele em um filão para a indústria cosmética. Consciente disso, esta os anuncia de forma agressiva e sem rodeios, especialmente na Índia e nos países do Sudeste Asiático, o que lhe concedeu a duvidosa honra de ser acusada de abandeirar uma nova - e multimilionária - vanguarda racista: branco é bonito; negro é vergonhoso.


Uma herança maldita, mas ainda em vigor nas sociedades pós-coloniais. Isto é, na maior parte do mundo. Como amostra, um símbolo. O anúncio de White Beauty (beleza branca), um creme da Pond’s da filial indiana da Unilever. Priyanka Chopra, uma das atrizes mais bonitas e famosas de Bollywood, sofre porque seu namorado, Saif Ali Khan, o herói indiano do momento, foi embora com a outra bonita da filmagem, Neha Dhupla. A garota abandonada vai recuperar seu amor quando conseguir ter uma pele mais pálida - graças, é claro, a White Beauty. O desenvolvimento desse famoso triângulo amoroso, anunciado em capítulos na televisão indiana, reabriu o debate sobre a grande obsessão pela pele branca nesse país, cuja maioria da população tem pele escura.

“É um escândalo, é um comercial muito racista que aumenta os preconceitos pela cor da pele”, diz Subashini Ali, presidente da Aidwa, ala feminista do Partido Comunista da Índia, promotora da campanha contra o comercial. Para Unilever da Índia, “não há intenção de discriminar de maneira alguma. Como empresa valorizamos e respeitamos a diversidade de necessidades e aspirações de nossos clientes”, diz seu porta-voz, Prasad Pradhan, que lembra que na Índia se usam tradicionalmente remédios caseiros para branquear a pele, e por isso a companhia só está trazendo um produto que o mercado demanda.

Para o professor da Escola de Administração Ross da Universidade de Michigan, estudioso da campanha da Unilever, Aneel Karnani, por sua vez, o anúncio reforça antigos preconceitos, “e não tradições inexistentes”. Karnani mostra-se preocupado também pelo sexismo da publicidade - “a mulher tem de estar bonita para satisfazer o homem” -, e lembra que a Unilever no Ocidente comercializa a marca Dove, responsável por uma campanha para “libertar a nova geração de estereótipos de beleza”.

O anúncio na Índia acionou os alarmes por se tratar de três superestrelas. Mas não é o primeiro nem o único. Os cremes branqueadores enchem as prateleiras das lojas indianas, acessíveis a todos os bolsos, começando desde o equivalente a menos de 1 euro até várias dezenas de euros por um tubo de creme. E a grande maioria tem comerciais deslumbrantes. Uma infinidade de marcas locais, mas também Nivea, L’Oreal, Procter and Gamble, The Body Shop, Avon, Clinique ou Revlon comercializam seus produtos.

É que o mercado indiano gasta em “cuidados da pele” mais de US$ 640 milhões por ano, segundo um estudo de mercado da AC Nielsen, uma cifra que não pára de crescer a passos agigantados.

Os analistas consultados por El País mostram sua preocupação pela facilidade com que esse racismo global - e seus anúncios - é aceito nos países asiáticos e do Pacífico, entre os quais se destacam China, Japão, Filipinas e Coréia. Neste último, a cirurgia estética nas pálpebras para conseguir olhos arredondados é a mais procurada. Nos EUA, essa operação é a terceira cirurgia estética mais procurada, só depois da lipoaspiração e do aumento dos seios.

“Em muitos países asiáticos, ter a pele branca era uma característica feminina, mas hoje, com campanhas agressivas e racistas, também é um sinal de modernidade aceito por toda a sociedade”, explica Amina Mire, professora do Departamento de Antropologia e Sociologia da Universidade de Carleton, Canadá. O mercado de branqueadores está, segundo Mire, perfeitamente assentado no continente asiático, o terceiro em lucros depois dos EUA e da Europa (onde são comercializados para mulheres brancas como produtos antiidade ou antimanchas).

Para Margaret Hunter, especialista em políticas raciais e de gênero da Universidade Mills da Califórnia, esse novo racismo global, originado por ideologias coloniais (as pessoas de raças mistas de compleição mais branca tinham situações privilegiadas em relação às mais escuras, por ter trabalhos protegidos dos raios de sol) e por um racismo interiorizado nas antigas colônias, e incentivado também por visões de uma nova ordem mundial. Este tem como premissa a exportação por parte dos EUA e de sua mídia da beleza branca e, ocasionalmente, a de mulheres negras de pele clara (e quanto mais clara melhor, vista a recente polêmica criada pelo suposto branqueamento, através do software Photoshop, da pele da cantora Beyoncé em um anúncio da L’Oreal).

Em todo o mundo, “na televisão, cinema, Internet ou imprensa se prefere a mulher loura e branca não mais como ideal cultural, mas como imperativo cultural”, diz Hunter. Estudos obtidos por ela indicam que nos EUA latinos e afro-americanos de pele mais clara têm maior acesso ao trabalho, status, dinheiro ou para encontrar parceiro(a). Algo que também ocorre na Índia, onde as mulheres mais morenas têm mais problemas para encontrar marido e seu dote encarece.

Nas sessões de anúncios de casamento, onde os pais buscam parceiros para seus filhos, a palavra “fair” (pele branca) sobressai em todos os anúncios. “Quero ter uma pele mais branca para ser mais aceito. Assim terei uma namorada mais bonita e meus ganhos aumentarão porque serei mais carismático”, diz um jovem visto em um mercado de Nova Déli comprando “Fair and Handsome” (branco e bonito), um dos produtos destinados ao público masculino.

Apesar de o desejo de embranquecer a pele cruzar o espectro social, é entre as classes médias e baixas que a indústria tem mais adeptos. Isso é o que mais critica também o professor Karnani: “Os produtos são vendidos para gente jovem e impressionável e para mulheres pobres, às quais vendem embalagens econômicas. É exploração. Isso não é potencializar a mulher, potencializar a mulher é fazê-la sentir-se bem do modo como nasceu, de forma que não sinta que tem de comprar esse produto. E, além disso, à diferença do comprimento do cabelo, de ser mais ou menos gorda, a cor da pele é impossível de mudar”.

Para outros, a questão não tem nada a ver com supremacia racial: “A obsessão por ser branco na Índia não tem viés racista, é só um conceito de beleza, todo mundo quer o que não pode ter”, diz uma estudiosa de comportamento do consumidor em Nova Déli, que prefere não dar seu nome.

Esse aumento no consumo de cosméticos não se limita aos subcontinente indiano e ao continente asiático. Nos EUA também se pratica, embora em menor medida, devido ao vigor do movimento pelos direitos civis entre a população negra. Segundo Amina Mire, assim como na África “onde o branqueamento foi associado à opressão colonial branca e os que o praticam são acusados de ter complexo de inferioridade, de se odiar. Por isso é praticado às escondidas”. Como branquear a pele é motivo de vergonha, os produtos são vendidos clandestinamente.

“A África é o lixo dos cremes tóxicos, portanto mais baratos”, afirma Mire, que acrescenta que como as pessoas os usam às escondidas só chegam ao médico quando os produtos tóxicos já causaram danos às vezes irreparáveis.

Tanto Mire quanto Hunter lembram que muitos países africanos proibiram o uso de determinados produtos por seu risco à saúde (em 2004 a Tanzânia proibiu 83 marcas diferentes, embora em muitos países continuem sendo encontradas sem dificuldade em mercados ou em vendedores ambulantes) e realizaram campanhas para promover a beleza estética africana, o que, segundo Hunter, é “um trabalho crucial, já que a mensagem de superioridade branca satura o mercado”.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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Via Síndrome de Estocolmo