quarta-feira, 5 de setembro de 2018


MUSEU NACIONAL - TADEU CHIARELLI



Gostaria de perguntar aos meus amigos do FB quando foi a última vez que visitaram o Museu Nacional. A pergunta não é apenas aos pesquisadores e museólogos, mas a todos. Não apenas para os cariocas e fluminenses, mas igualmente para aqueles que, mesmo morando fora do Rio, sempre que podem estão por lá. E a mesma pergunta vai para os “apaixonados por museus”, aqueles que visitam as instituições de fora do país e pouco prestigiam as brasileiras. Quando foi a última vez que todos vocês visitaram o Museu Nacional?

Faço esta pergunta porque a minha última visita ao MN foi em 2013. Fui levar uns sobrinhos queridos para conhece-lo. Naquela visita, a tragédia já estava ali, e se manifestava por uma série de salas fechadas, por elementos com óbvios problemas de manutenção, por peças em exibição precisando de cuidados.

O que fiz? Acho que no máximo comentei com os familiares sobre o “abandono” do Museu. É claro que o que percebi – eu sabia –, devia ser a ponta do iceberg que na noite de domingo transformou o MN naquele fogueirão visto por todos. Mas minha indignação foi transformada em algum tipo de ação mais efetiva? Pelo menos escrevi uma carta para algum jornal alardeando aquela situação? Não. Simplesmente não fui mais ao MN em minhas idas para o Rio.
Faz poucos meses, li uma matéria em que o diretor do Museu tornava pública mais uma vez a situação da instituição, há décadas sem condições de levar a bom termo seus objetivos. Na sua fala dava para saber sobre seus esforços, e de sua equipe, para levar adiante a instituição, as pesquisas ali realizadas, sem o apoio efetivo das autoridades federais, estaduais e municipais. Sem um engajamento efetivo da Universidade.

O que fiz? Silenciosamente me solidarizei e ficou por isso mesmo.
Agora o incêndio e a perda de um patrimônio incalculável, de pesquisas fundamentais. Agora a gritaria, o dedo acusatório.

Brasileiro não gosta de museu e é por isso que faço de novo a pergunta: quantos dos meus amigos tinham visitado o MN?
Não faz parte da cultura do brasileiro visitar museus, e aqui não estou me referindo ao povão, falo da elite econômica brasileira – você, eu e a turma toda –, aquela que ganha a partir de cinco salários mínimos por mês (porque, na atual conjuntura do Brasil, estar empregado e ganhar mais do que cinco salários mínimos é ser da elite, sim, senhores e senhoras).

Brasileiro não frequenta museu no Brasil e quando o faz, fica mais preocupado em chamar a atenção para as falhas que encontra do que para os pontos positivos em que tropeça. Aliás, gostam muito de encontrar pontos negativos para comparar com os (poucos ou muitos) museus que visitam na estranja.
O Museu Nacional, com seus dois séculos de história, foi um dos acervos mais importantes do Hemisfério Sul, foi o fruto de uma imensa equipe que, em sua maioria anônima, se perde no tempo. Um pessoal voltado para os objetivos de coletar, armazenar, estudar e exibir/divulgar um acervo que se espraiava por várias áreas do conhecimento humano. Devemos esse museu a essas gerações de trabalhadores abnegados das mais diversas áreas e não a você ou a mim, porque só nos interessamos de fato por museus no Brasil quando eles pegam fogo. No mais, estamos é preocupados em visitar o MoMa de Nova York ou algum outlet em Orlando (o que acaba dando no mesmo, para muitos, com a vantagem de que, no último dá para comprar mais).

O incêndio como símbolo do desmanche da cultura e da educação do governo #foratemer? Claro, mas não somente.
O último presidente a visitar o Museu Nacional foi Juscelino Kubitscheck, morto há 42 anos. Jânio Quadros, João Goulart, Castelo Branco, Costa e Silva, Geisel, Figueiredo, Tancredo, Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula, Dilma e temer, todos eles e ela não tiveram tempo, ou paciência, ou saco para visitar aquele acervo e centro de pesquisa universitário. Um time que reúne presidentes de esquerda, direita e tico-tico no fubá – nenhum deles deu nem uma passadinha por ali.

É que brasileiro não gosta de museu. Brasileiro não gosta de museu e possui uma perversa predileção por ver o circo pegar fogo.
As apostas já começaram: qual será o próximo museu, ou a próxima instituição a queimar no Rio, a Biblioteca Nacional, o Museu Nacional de Belas Artes? E em São Paulo (alguns torcem para que o Museu do Ipiranga vire cinza porque “seria o fim do PSDB”)? E em Santa Catarina, Pará, Pernambuco?

Brasileiro não gosta de museu e de biblioteca, centro culturais, e não gosta de educação, de cultura e de arte e de ciência. Para eles é tudo coisa de frescos e/ou esnobes, que deveriam queimar junto com as velharias que fazem entupir esses espaços (aliás, o edifício do MN, desde que devidamente guaribado, daria um lindo shopping).

Faz cinco anos que não visito o Museu Nacional do Rio de Janeiro e nunca mais poderei repetir a experiência. Fico com pena daqueles que nunca o visitaram – como não visitaram a maioria dos museus de suas cidades –, e agora apedrejam os fantoches que “governam” nossas instituições (incluindo aqui a UFRJ, apontada por muitos – e de maneira irresponsável –, como a única culpada pelo incêndio do Museu). Tudo bem apedrejá-los. Mas antes, por favor, apedrejem a si mesmos.
 
TADEU CHIARELLI