quinta-feira, 11 de setembro de 2014

O Brasil tem que prestar mais atenção na Caatinga

Via O ECO
Por Enrico Bernard e Felipe Pimentel Lopes de Melo*
10/09/14

"Barbaramente estéreis; maravilhosamente exuberantes... Na plenitude das secas são positivamente o deserto... Ao sobrevir das chuvas, a terra, como vimos, transfigura-se em mutações fantásticas, contrastando com a desolação anterior. Os vales secos fazem-se rios. Insulam-se os cômoros escalvados, repentinamente verdejantes. A vegetação recama de flores... Da extrema aridez à exuberância extrema..."

Euclides da Cunha (1866-1909), em "Os Sertões", ao se referir aos contrastes da Caatinga nas estações seca e chuvosa.
 
Como reconhecido por Euclides da Cunha, na obra que alguns consideram um dos maiores clássicos da literatura brasileira, contraste parece ser a palavra-chave na Caatinga. Estes contrastes se manifestam de várias formas, tal quando comparamos a imagem que o brasileiro médio não morador deste ambiente tem da Caatinga e o que ela realmente é. No imaginário, um quase deserto, esturricado e pobre em todos os sentidos, inclusive em vida.

Na realidade, a Caatinga é um mosaico de ambientes que se mostram ricos e únicos. E é este plural que faz com que estes ambientes tenham a maior biodiversidade entre as florestas secas do planeta. Em fisionomias vegetais, que vão desde arbustos espinhosos até florestas sazonalmente secas, já foram registradas ao menos 932 espécies de plantas vasculares, 187 de abelhas, 240 de peixes, 167 de répteis e anfíbios, 62 famílias e 510 espécies de aves, e 148 espécies de mamíferos. Mesmo assim, a Caatinga é o bioma terrestre brasileiro menos conhecido, e seu número real de espécies é provavelmente muito maior, uma vez que cerca de 40% da região nunca foram investigados e 80% permanecem subamostrados. Ou seja, sob o ponto de vista científico, mais descobertas estão por vir.

Continua


*Enrico Bernard é o responsável pelo Laboratório de Ciência Aplicada à Conservação da Biodiversidade, no Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Recife. Felipe Pimentel Lopes de Melo é chefe do Laboratório de Ecologia Aplicada, no Departamento de Botânica, também da UFPE.