sexta-feira, 27 de novembro de 2015

“O poder público negligenciou nas questões de fiscalização e monitoramento das atividades de funcionamento da barragem” - Professor Ernani Carlos de Araújo

JC-Notícias/SBPC
27.11.2015

Em carta aberta endereçada à Dilma Rousseff, o professor Ernani Carlos de Araújo, da Ufop, solicita à presidente que tome para si a responsabilidade de garantir que os recursos oriundos da multa à Samarco pelos danos causados ao meio ambiente “sejam efetivamente aplicados em projetos que tragam de volta a vida ambientalmente sustentável local”

Veja a carta na íntegra:

CARTA ABERTA À EXCELENTÍSSIMA PRESIDENTE DO BRASIL

Excelentíssima presidente do Brasil, Dilma Vana Rousseff. Meu nome é Ernani Carlos de Araújo. Sou professor da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e dou aulas nas graduações para os Cursos de Engenharia de Minas, Engenharia Civil e Arquitetura. Para a pós–graduação, dou aulas para o mestrado e doutorado. Dirijo-me a Vossa Excelência para manifestar a minha indignação à tragédia ocorrida em Mariana (MG), na tarde do dia 5 de novembro de 2015, pelo rompimento de duas barragens de rejeito de minério de ferro pertencentes à Samarco Minerações que pertence também à Vale do Rio Doce e à empresa Anglo-Australiana BHP Billiton.

Primeiro, devemos lembrar que a Vale do Rio Doce é ainda estatal, pois, no processo de privatização, as ações passaram a pertencer aos fundos de pensão do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Lembro ainda que uma barragem com apenas 7 anos de vida útil, como a que rompeu, nunca deveria ter se rompido, tendo em vista que era relativamente nova e que os fatores climáticos (chuva) não contribuíram para a sua sobrecarga. Assim, por ser relativamente nova, esta foi concebida com recursos de projetos computacionais modernos, com parâmetros variados, e executada com insumos também atuais.

Desta forma, julgamos que o poder público negligenciou nas questões de fiscalização e monitoramento das atividades de funcionamento. Como pode ser verificado, a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) fez apenas uma fiscalização nas medições da barragem no período de um ano, o que mostra a negligência do poder público estadual e Federal (Ibama).

Inicialmente, julgávamos que os danos causados seriam recuperados ao longo de décadas, mas levando em consideração a composição desta lama, que possui elementos químicos com alto poder cimentício, julgamos agora que os efeitos nocivos e devastadores desta lama ao meio ambiente somente proporcionará reversibilidade em séculos ou até milênios. Toda a flora e fauna da região de Bento Rodrigues foram dizimadas por período indeterminado e o passivo ambiental é impagável e irrecuperável num tempo de curto e médio prazo.

O governo determinou uma multa de R$250 milhões à Samarco pelos danos causados ao meio ambiente. Esta multa seria paga pelo governo federal e pelos bolsos dos próprios brasileiros, já que a empresa foi privatizada, mas está sob os comandos do governo federal por meio dos fundos de pensão do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Desta forma, venho me solidarizar com o povo mineiro, e em especial com o povo de Bento Rodrigues, e solicitar que a excelentíssima presidente interceda junto à multa aplicada à empresa no sentido de evitar extravios destes recursos para outros fins e que estes sejam efetivamente aplicados em projetos que tragam de volta a vida ambientalmente sustentável local.

Sugerimos que seja criado na região da tragédia vários tipos de “greenhouses”, aos moldes europeus, transformando o local em um Polo Verde de produção de mudas das plantas nativas, verduras e legumes orgânicos e plantas fitoterápicas, além de um centro de pesquisa Ortobotânico.

Além disso, sugiro a criação de um centro de pesquisas ambientais de Flora e Fauna da região afetada, para o monitoramento e um projeto de recuperação do Urbanismo local aos moldes originais. Coloco-me à inteira disposição de V. Excelência para fazermos uma parceria para podermos dar de novo a dignidade destes cidadãos que foram afetados diretamente com a tragédia e também para aqueles que estão sendo afetados pelo desabastecimento de água do Rio Doce.
Atenciosamente,

Prof. Ernani Carlos de Araújo
 
Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto.
 
Ouro Preto, 16 de Novembro de 2015.