sábado, 23 de janeiro de 2016

Quando ter celular é bem mais fácil do que ter água limpa

JC-Notícias/SBPC
22.01.2016

Relatório do Banco Mundial mostra que avanços da tecnologia não eliminaram problemas básicos do mundo em desenvolvimento

Nos países em desenvolvimento, mais famílias têm acesso a celulares do que a eletricidade ou água limpa. É o que aponta o novo relatório do Banco Mundial, chamado “Dividendos digitais”. A publicação revela que, apesar dos avanços na tecnologia, o mundo não conseguiu resolver muitos de seus problemas estruturais.

Segundo o documento, 40% da população mundial têm acesso à internet. Entre os 20% mais pobres do mundo, sete em cada dez pessoas têm acesso à web.

Mas se o mundo está mais conectado do que nunca, questões básicas, associadas a condições de vida, ainda persistem como um problema. “Casas mais pobres têm mais probabilidade de ter acesso a celulares do que a banheiros ou água tratada”, diz o documento. Veja no gráfico, na página da notícia, elaborado pelo Banco e traduzido pelo Nexo.

A situação se reproduz  no Brasil. Em Rondônia, por exemplo, 74% dos domicílios têm pelo menos um celular, segundo a PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios) de 2014. Mas apenas 38% dos municípios do Estado têm acesso à água tratada; 4% têm acesso a tratamento de esgoto, segundo o instituto Trata Brasil. No Acre, enquanto apenas 17% dos domicílios têm tratamento de esgoto, 71% têm celular.

Entre a população brasileira mais pobre – que tem rendimentos até R$ 220 por mês -, 49% têm um aparelho celular.

Tecnologia não traz desenvolvimento direto

A adoção de novas tecnologias hoje é mais rápida. “Para a Indonésia se beneficiar dos barcos a vapor demorou 60 anos. Para o Quênia ter eletricidade foram 60. Mas, para o Vietnã ter computadores foram apenas 15 anos. E para celular e internet foram apenas alguns poucos anos”, diz o estudo. Ao acompanhar essa evolução, percebemos que a distribuição das diferentes tecnologias se dá de maneira menos concentrada do que a renda.

Para o Banco Mundial, as tecnologias digitais têm potencial para promover desenvolvimento por meio de três mecanismos: inclusão, eficiência e inovação. No entanto, ao cruzar dados de condições de vida com informações sobre acesso a novos meios de comunicação, fica claro como sua capacidade de promover mudanças estruturais não corresponde necessariamente ao esse potencial.

“Apesar de haver muitas histórias individuais de sucesso, o efeito da tecnologia na produtividade global, na expansão de oportunidades para os pobres e para a classe média, e no crescimento de governanças responsáveis tem sido muito menores do que o esperado”, diz o relatório.

O documento afirma que governos em países digitalmente avançados, como Estônia, Coreia e Cingapura, podem e devem aproveitar a tecnologia para prover políticas públicas mais eficientes,  baseadas em evidência e que resultem da integração de diversas áreas.

Ainda no campo da política e da administração pública, a tecnologia pode promover novas formas de democracia participativa, como na Islândia, onde os moradores estão, pelas redes, colaborando para a elaboração de uma nova Constituição.

Mas a simples existência da tecnologia não garante democracia ou mesmo participação.  De acordo com o relatório, enquanto o número de democracias está crescendo, a porcentagem de “eleições livres e justas” está caindo. Isso porque quando a tecnologia é utilizada sem transparência, ela serve para “amplificar as vozes das elites, o que pode resultar acúmulo de poder e maior controle de Estado”.

Por fim, o Banco diz que “como as economias de internet favorecem monopólios naturais”, a ausência de ambientes de competição resulta em mercados mais concentrados.

Esses são problemas que fazem parte da história e da estrutura dos diversos países. Ou seja, não acontecem por causa da tecnologia, mas apesar dela. O que chama a atenção é que a revolução digital se espalhou, mas os dividendos que ela pode trazer, ainda não.

Para o Banco Mundial, para que a tecnologia possa realmente prover mudanças estruturais no mundo, a economia digital precisa ser construída sobre fundações consistentes, com regulações que criem um ecossistema dinâmico de negócios onde e que as empresas possam de fato  estar se nivelar para competir e inovar, empoderando trabalhadores, empreendedores e todo tipo de cidadão.

No entanto,  os dados do estudo  ilustrados nos gráficos abaixo, traduzidos pelo Nexo, mostram que mudanças em aumento de produtividade, combate à desigualdade e governanças democráticas ainda são desafios globais.

Nexo