Via Conselho Indigenista Missionário - CIMI
Fonte da notícia:
Apublica- Agência de Reportagem de Jornalismo Investigativo
Por Jessica Mota, da Apublica
28.02.2013
Uma mulher dá de mamar a um macaco guariba. Outros dois meninos brincam com um periquito e um terceiro, deitado em uma rede, com um quati. A imagem de galhos e folhas de árvores é coberta por uma fala de som inusitado, a língua guajá.
As cenas são de um vídeo produzido pela Survival International como parte de uma campanha para salvar a “tribo mais ameaçada do mundo”, segundo a organização, os Awá-Guajá. Atualmente, os índios dessa etnia ocupam três áreas no Maranhão: a Terra Indígena Alto Turiaçu, a Terra Indígena Awá e a Terra Indígena Carú.
“Na verdade, [a área das terras indígenas] só tem esse formato devido ao empreendimento Carajás, que dividiu uma grande reserva florestal, a do Gurupi, para se tornar esse mosaico que é hoje”, conta Rosana Diniz, coordenadora regional do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) no Maranhão.
Ela se refere à Estrada de Ferro Carajás (EFC), do Programa Grande Carajás, o pólo de produção e exportação de minérios da então Vale do Rio Doce – hoje Vale S/A – implantado nos anos 80. O trem que parte da Floresta Nacional de Carajás, no Pará, onde ficam as minas da Vale, segue pelo Maranhão até o porto de exportação próximo a São Luís, é o maior do mundo. São quatro locomotivas e 330 vagões que atravessam com estrondo reservas florestais, terras indígenas, comunidades quilombolas e de pequenos agricultores.
Ainda nos anos 80, a Vale firmou um convênio com a Fundação Nacional do Índio (Funai) para demarcar o território dos Awá-Guajá no Maranhão, apoiando financeiramente o processo. Assim surgiu a Terra Indígena Awá, localizada a 35 km da Estrada de Ferro Carajás. Também estão na área de influência da ferrovia as terras indígenas Carú e Mãe Maria afetadas, no momento, pela expansão da Estrada de Ferro Carajás como parte de um projeto da Vale de duplicar a extração de minério no Pará.
“O BARULHO DO TERROR”
O contato com os Awá-Guajá no Maranhão é recente, poucos falam algumas palavras de português. Há mesmo notícias de Awá-Guajás não contatados. Como vivem da caça e da coleta, circulam pelo território e sentem dramaticamente qualquer impacto sobre ele.
“Os Awá tem toda uma teoria sobre o barulho, sobre o som, que inclusive forma o conhecimento deles sobre a caça. O silêncio na mata é muito valorizado. Eles conseguem ouvir a chuva quando está chegando, minutos antes de ela cair. Então eles têm toda uma teoria nativa sobre o barulho e o barulho do trem é um barulho do terror”, explica Uirá Garcia, antropólogo que trabalha com os Awá-Guajá.
As aldeias mais próximas da ferrovia estão na Terra Indígena Carú. São as aldeias Awá e Tiracambú, distantes cerca de 1,1 km e 1,7 km da ferrovia, respectivamente. Além do ruído que espanta a caça e causa medo às crianças, os Awá-Guajá convivem com desmatamento e a exploração ilegal de madeira no território invadido pela chegada de migrantes atraídos pelos grandes empreendimentos econômicos na região.
“Considerando que é um povo caçador e coletor, que vive exclusivamente da floresta e consequentemente não tem políticas voltadas para esse modo de vida – nem por parte da Funai, nem na assistência da saúde -, esses elementos nos levam a concluir que esse é, realmente, o povo mais ameaçado no Brasil”, acredita Rosana Diniz. CONTINUA!