JC e-mail 4867, de 03 de dezembro de 2013
Novo estudo renova esperança de cura da Aids
Pesquisadores conseguiram reduzir infecção a níveis indetectáveis utilizando radioimunoterapia
Pela primeira vez na luta contra o HIV, pesquisadores conseguiram atingir os reservatórios do vírus no corpo humano, indicando uma esperança de cura para a Aids. Apresentado na reunião anual da Sociedade Radiológica da América do Norte (RSNA ), o estudo utilizou radioimunoterapia e conseguiu reduzir a infecção a níveis indetectáveis em amostras de sangue de pacientes tratados com antirretrovirais.
A terapia antirretroviral altamente ativa (HAART, na sigla em inglês), é capaz de melhorar a qualidade de vida de infectados pelo HIV e reduzir em 96% a taxa de transmissão do vírus, já que suprimi a sua replicação no organismo. No entanto, os cientistas já haviam identificado reservatórios de células infectadas de forma latente que persistiam no corpo, o que impossibilitava uma cura permanente.
- Num paciente tratado com HAART, as drogas suprimem a replicação viral, o que significa que elas baixam o número de partículas virais na corrente sanguínea. Entretanto, o HAART não pode matar as células infectadas pelo HIV - disse Ekaterina Dadachova, professora de radiologia, microbiologia e imunologia da Escola de Medicina Albert Einstein, em Nova York, e principal autora do estudo. - Qualquer estratégia para curar a infecção pelo HIV deve incluir um método para eliminar as células infectadas por vírus.
Em seu estudo, Ekaterina e uma equipe de pesquisadores administraram radioimunoterapia em amostras de sangue de 15 pacientes com HIV tratados com HAART no Centro Einstein-Montefiore para Pesquisas da Aids.
Historicamente utilizada para combater tumores, a radioimunoterapia usa células de anticorpos monoclonais - clonados a partir de um linfócito B -, que são recrutadas pelo sistema imunológico para identificar e neutralizar os antígenos, objetos estranhos tais como bactérias e vírus que estimulam uma resposta imune no organismo.
Concebido para reconhecer e se ligar a um antigénio celular específico, o anticorpo utilizado na terapia é combinado em laboratório com um isótopo radioativo. Quando injetado na corrente sanguínea do paciente, ele viaja para a célula-alvo, onde a radiação é então introduzida.
- Na radioimunoterapia os anticorpos se ligam às células infectadas e as matam por radiação - afirmou Ekaterina. - Quando ela é combinada com o HAART, eles matam o vírus e as células infectadas, respectivamente.
Os pesquisadores uniram o anticorpo monoclonal (mAb2556), projetado para atacar uma proteína expressa na superfície das células infectadas pelo HIV, com o radionuclídeo bismuto-213.
- Os testes eliminaram pelo menos mais da metade de todas as células infectadas em cada amostra. Em muitos casos, eliminaram todas as células - explicou a pesquisadora ao GLOBO.
No geral, a infecção foi reduzida a níveis indetectáveis, e as células infectadas foram destruídas sem prejuízo para as células vizinhas.
Atuação no cérebro
Uma parte importante do estudo testou a capacidade do anticorpo radiomarcado de atingir células infectadas com o HIV no cérebro e no sistema nervoso central (SNC). Utilizando um modelo in vitro da barreira hematoencefálica - estrutura membrânica que atua principalmente para proteger o SNC -, os investigadores demonstraram que o novo anticorpo conseguiu atravessá-la e matar as células infectadas pelo HIV, sem qualquer dano para a membrana.
- O tratamento antirretroviral penetra apenas parcialmente a barreira hematoencefálica, o que significa que, mesmo se um paciente está livre de HIV de forma sistêmica, o vírus ainda é capaz de a atingir o cérebro, causando transtornos cognitivos e declínio mental - relatou Ekaterina. - O nosso estudo mostrou que a radioimunoterapia é capaz de matar as células infectadas por HIV, tanto sistemicamente quanto no sistema nervoso central.
Mesmo em níveis indetectáveis, a infecção pode voltar nos casos em que as células infectadas não foram completamente removidas.
- É por isso que planejamos administrar o tratamento ao menos duas vezes nos pacientes no futuro - contou Ekaterina.
Ensaios clínicos em pacientes com HIV são o próximo passo da pesquisa. Segundo estimativas da pesquisadora, os testes devem ser realizados em meados de 2014.
(Maria Clara Serra/O Globo)