sábado, 4 de outubro de 2008
A importância da sociedade internacional na tutela jurídica da dignidade da mulher
Renato Toller Bray - Canal Rio Claro - SP - 30/08/08
A violência contra a mulher é um tema que interessa ao Estado, à sociedade internacional e à sociedade civil articulada. Por isso, os atores mencionados, ao lado do Poder Público, em parceria, devem instituir mecanismos de proteção jurídica na tentativa de estabelecer penas aos que agridem a dignidade da mulher. A pena deve ser justa, sua imposição deve ser inevitável em detrimento da maioria.
A vergonha, a humilhação e a dor física são situações de sofrimento que as mulheres sentem em decorrência dos atos de violência, sendo certo que, na maioria das vezes, os agressores ingerem bebidas alcoólicas, agem movidos pelo ciúme, além de fazerem o uso de substâncias entorpecentes, os quais são apontados pelos estudiosos e especialistas no assunto, como fatores que desencadeiam as desavenças familiares; entre os principais agressores, no ambiente familiar, convém apontar: os maridos, namorados, pais, irmãos, companheiros, chefes, etc. A maioria dos agressores justifica suas ações com base em escusas machistas, pois ainda acredita na sua força de dominação e entende que possui o direito impor sua vontade.
Diante desse fato, a Lei nº. 11.340/06 representa um avanço muito salutar ao considerar que a sua aplicação possibilita penalidades mais rigorosas para o agressor, pois o resultado será a detenção imediata, a estipulação de um alto valor para a fiança e, ainda, facilita o acesso do agressor aos meios de recuperação e tratamento, independentemente de qualquer orientação e expressão sexual das pessoas envolvidas. A boa notícia é que a lei mencionada pode ser aplicada a qualquer momento pelas autoridades, desde que o agressor se enquadre nas hipóteses legais previstas.
Ressaltamos que, para mobilizar as autoridades na criação de um diploma legal de proteção à dignidade da mulher, Maria da Penha, durante duas décadas, fez de sua tragédia pessoal uma bandeira de luta, já que se envolveu num incidente que a tornou paraplégica, após ter sido atingida nas costas por um projétil disparado por seu marido, enquanto ela dormia. Convém ainda registrar que houve uma segunda tentativa de homicídio: o marido a empurrou da cadeira de rodas e tentou eletrocutá-la embaixo do chuveiro. Na luta pela consagração de seu direito, Maria da Penha precisou recorrer à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, que denunciou o Brasil por omissão, tolerância e impunidade contra as mulheres brasileiras violentadas, com fundamento na "Convenção de Belém do Pará", ratificada pelo Brasil em 1995. Tal diploma internacional é importante em sede regional, pois considera que o reconhecimento e o respeito irrestrito de todos os direitos da mulher são condições indispensáveis para seu desenvolvimento individual e para a criação de uma sociedade mais justa, solidária e pacífica. Ademais, no preâmbulo, o texto salienta que a violência em que vivem muitas mulheres da América, sem distinção de raça, classe, religião, idade ou qualquer outra condição, é uma situação generalizada. A necessidade de dotar o Sistema Interamericano de um Instrumento Internacional que contribua para solucionar o problema da violência contra a mulher igualmente é objeto de preocupação dos Estados signatários da Convenção.
Os direitos humanos das mulheres foram se consolidando, gradativamente, e a sua conquista tornou-se um instrumento de ordem e tutela jurídica com base nos princípios da universalidade e indivisibilidade. A construção dos princípios dependeu, de certa forma, das pressões dos movimentos articulados de mulheres vítimas de violência, tanto no plano nacional, como no internacional. Entendemos que o direito nasce das lutas e das reivindicações sociais, pois acreditamos na defesa jurídica sustentada por Rudolf Von Ihering, autor da obra "A luta pelo direito".
Quanto ao papel do Estado, é de sua responsabilidade programar ações eficientes de forma a prevenir, punir e erradicar as diversas modalidades suscetíveis de violência por meio de Políticas Públicas, com vistas à superação dessa deficiência e torpeza. Portanto, sem democracia e participação conjunta dos setores mais relevantes da sociedade civil brasileira, que atuam na defesa da proteção da dignidade das mulheres, dificilmente se obterá conquistas e avanços na área em questão, o que também depende da ação da sociedade internacional, pois é fato que a Lei Maria da Penha, para sua criação, não só dependeu de lutas reivindicatórias no plano interno, mas sobretudo deve-se muito à força das Convenções Internacionais e das pressões exercidas pela sociedade internacional.
Bray, Renato Toller - Professor de Direito Internacional com atuação docente no IMESB - Bebedouro - SP.
Gabriel, Victor Fabricio - Graduando em Direito no IMESB (Bebedouro-SP). Co-autor do artigo.
--- Publicado pelo Canal Rio Claro (SP), 30/08/08.
Via Instituto Patrícia Galvão