segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Carta de uma arqueóloga do presente, por Niède Guidon

AO ARQUEÓLOGO DO FUTURO - Via Agência Carta Maior - 01.09.2004



Carta de Niède Guidón, a arqueóloga que, com suas descobertas no Piauí, revolucionou as teorias sobre a ocupação da América pelo homem primitivo, comprovando a presença de humanos em período anterior ao suposto povoamento das Américas através do estreito de Bhering e conseqüente
povoamento das Américas a partir do norte.




Caro colega do futuro,

Você está quase no final de um século que vi nascer. No exercício de minha profissão, encontrei indícios, vestígios, e propus hipóteses sobre como vivia o Homem do passado, como usava suas ferramentas, como preparava suas armas.

Meu caro colega, mesmo não sabendo como você é - talvez uma máquina inteligente -, escrevo-lhe como se estivesse dirigindo-me a um Homem. E escrevo-lhe com a emoção de um Homem. Um Homem desse início de século que nos abriga. Caso encontre dificuldade em entender-me, tenho certeza de que poderá recorrer a sofisticados dicionários, a sofisticados programas para computador, que lhe permitirão descobrir o sentido exato das minhas palavras.

No início, todos os Homens viviam como caçadores-coletores. Para adquirir conhecimento e conviver com as outras espécies da natureza, para sobreviver com os parcos recursos biológicos que tinham, esses Homens necessitavam de grande coesão social. O saber era passado dos adultos para os jovens, igualmente. Sabiam que não podiam ter proles numerosas porque, ao contrário dos outros animais, o filhote humano levava anos para aprender e ser capaz de sobreviver só. Todos executavam todas as tarefas, todos eram iguais. Os chefes comandavam com base em sua força física, que, como todos os recursos biológicos, nasce, atinge seu apogeu e definha. Assim, um chefe exercia seu poder durante um tempo limitado, até que um outro membro da tribo, mais jovem, mais forte, o suplantava. Continua