06.01.2012
Entrevista
Foi com surpresa e indignação que a população do semiário e a Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA receberam a notícia de que o governo pretende investir em cisternas de plástico em vez de dar continuidade ao projeto de construção de cisternas de placas. Na avaliação de Roberto Malvezzi, a proposta governamental “é um desastre”, porque o governo "não está apenas trocando uma tecnologia por outra, mas desmantelando todo um processo educativo de convivência com o semiárido”.
(Portal IHU)
Segundo ele, a cisterna de placa é o melhor modelo para armazenar água e garantir sua qualidade, porque não há riscos de vazamento e contaminação da água. Desde 2003, cerca de 400 mil famílias já foram beneficiadas com o Programa 1 Milhão de Cisternas, atendendo a 2 milhões de pessoas.
Em entrevista à IHU On-Line, concedida por e-mail, Malvezzi enfatiza que as “oligarquias nordestinas não se conformavam em ver o povo mais autônomo e buscavam um meio de retomar o controle da água sobre essas populações. Talvez conseguirão ao serem os doadores das cisternas de plástico”. E reitera: “O governo está sinalizando na direção de continuar a parceria com a ASA, mas não parece a fim de desistir das cisternas de plástico. Portanto, parece que pensa em levar as duas tecnologias à frente. Logo, se assim for, resgatará o clientelismo eleitoral através da água, que julgávamos definitivamente enterrado”.
Roberto Malvezzi é graduado em Estudos Sociais e em Filosofia pela Faculdade Salesiana de Filosofia Ciências e Letras de Lorena, em São Paulo. Também é graduado em Teologia pelo Instituto Teológico de São Paulo. Atualmente atua na Comissão Pastoral da Terra – CPT.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como avalia a proposta de o governo federal investir em cisternas de plástico em vez de cisternas de concreto? O que justificaria esta mudança? Como a população do semiárido reagiu a essa notícia?
Roberto Malvezzi – Com indignação profunda. Essa decisão foi uma surpresa total para toda a Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA. Afinal, a cisterna de concreto é um trabalho premiado no mundo inteiro, inclusive pelo próprio governo brasileiro. Cerca de 400 mil famílias já foram beneficiadas, atendendo a 2 milhões de pessoas. Aproximadamente 12 mil pedreiros foram capacitados em 10 anos. Então, ninguém entende essa mudança, inclusive integrantes do governo.
IHU On-Line – Por que é preferível investir nas cisternas de placas?
Roberto Malvezzi – Várias tecnologias para armazenamento da água de chuva já foram testadas. O princípio da coleta da água da chuva remonta aos tempos bíblicos. O problema é a forma adequada de guardá-la. Tentamos usar a cisterna de pedra e cal, mas não deu certo. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra tentou uma cisterna de plástico em assentamentos, em Sobradinho e não deu certo.
A única cisterna que comprovadamente funcionou foi a de placas de cimento. Acontece que ela é uma invenção de um pedreiro baiano, chamado Néo, que hoje mora em Sergipe. Ele foi trabalhar em São Paulo e aprendeu a fazer placas de cimento para construção de piscinas. Essa técnica é totalmente voltada para que a água não vaze. Quando voltou ao sertão, ele decidiu fazer um reservatório para guardar a água de chuva utilizando a técnica das placas para fazer piscina. Sem querer, ele descobriu o “ovo de Colombo”. Daí a generalização para todo o semiárido. Os pedreiros aprendem a construí-la, sabem fazer sua manutenção. A de plástico fica totalmente dependente da empresa. Uma vez rachada, vira um pacote de lixo. Continua
Cisternas de plástico custam mais que o dobro das cisternas de placa
Verônica Pragana - Asacom
16/12/2011
Enquanto a Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA) reivindica os recursos previstos para a continuidade de suas ações, o governo federal vai investir R$ 1,5 bilhão na instalação de 300 mil cisternas de plástico. O valor gasto pelo governo corresponde a mais que o dobro do que a ASA gastou para construir 371 mil cisternas de placas no Semiárido.
Cada cisterna de plástico custa aos cofres públicos R$ 5 mil, segundo informou ontem (14) o Ministério da Integração Nacional numa reunião com representantes da ASA, em Brasília. A cisterna de placa custa R$ 2.080,00. No Programa Água para Todos, além das 300 mil cisternas de plásticos, serão construídas 450 mil de placa.
Outro fator que tem grande importância neste comparativo é o volume de recursos que são movimentados na economia local quando as cisternas são construídas. Para cada dez mil cisternas de placas feitas, são injetados na economia local R$ 20 milhões, através de compra de matéria-prima na região, contratação de pedreiros das comunidades e impostos. Já as cisternas de plástico serão fabricadas por indústrias e entregues nas comunidades rurais por empreiteiras.
A Articulação no Semi-árido (ASA) tem encabeçando uma campanha contra as cisternas de plástico. Além de economicamente inviável, a ASA aponta outros fatores negativos em relação à distribuição desse equipamento que já vem pronto para as famílias. Um deles diz respeito ao não domínio da técnica de construção pelas famílias e pedreiros da região.
Para a sociedade civil, a disseminação ds cisternas de plástico é uma nova forma de atuação da “indústria da seca”, cujas obras são feitas sob a alegação de “combater a seca” que sempre beneficiaram poucos, mantendo o poder das elites dominantes.
Veja aqui documento da campanha Cisternas de Plástico/PVC - Somos Contra!
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