terça-feira, 12 de março de 2013

Nossa indigência cultural chegou ao Camaro Amarelo

Via Bula Revista
Por Edival Lourenço
11.03.2013

É notável como nos últimos 40 anos todos os valores morais e estéticos se empalideceram perante a arrogância do consumo. Empalideceram e ofereceram rendição. Agora, tudo na vida se resume a relação de consumo. Basta comparar os laços familiares de 30, 40 anos atrás com uma família de hoje em dia. Os vínculos familiares eram fortes, para o amor e para o ódio. A começar pelo modo de acomodação dentro de casa, demonstrando sinais de intensidade nas relações. A prole era de modo geral numerosa. De costume, os filhos homens dormiam todos num mesmo quarto e as mulheres num outro. Isso nas classes de média acima. Nas classes menos privilegiadas, os filhos homens e mulheres dormiam no mesmo quarto, separados quando muito pelo improviso de um biombo de lençol ou coberta pendurada numa corda abaixo do teto. Não havia espaço para segredos entre os familiares. Todos sabiam de tudo o que se passava com os demais e se achavam no direito de opinar e tomar partido sobre qualquer questão.

Hoje, cada filho detém um apartamento (ou departamento) no interior da casa dos pais. E assim como não sabemos o que se passa com o nosso vizinho do apartamento em frente ao nosso, ou mal sabemos o seu nome, os irmãos que moram na mesma casa também mal se conhecem. As pessoas estão encavernadas, envolvidas com suas TVs, com seus leptops, com seus iphones, conectadas umbilicalmente em sua solidão hitech. As famílias não têm mais apego, nem raiz sentimental. São como cultivo hidropônico, em que os agricultores (os pais) fazem chegar os nutrientes (grana) através de uma água rala sem terra e sem suporte (sentimentos frouxos). Vivemos a era das famílias hidropônicas. A família como mera organização para o consumo.

É evidente para todos nós que essa mudança de hábitos, essa rendição ao consumo, se deu graças ao esforço contínuo do mercado em transformar todas as pessoas do mundo em consumidoras. Não em cidadãos, mas em consumidores. Daí não termos especificamente um Código do Cidadão, mas um Código do Consumidor. Mas a pergunta primordial é a seguinte: Qual o flanco moral que se rompeu para que o mercado pudesse impor o novo modo de vida, sem que as pessoas oferecessem resistência, ou ao menos desconfiassem que alguma coisa poderia dar errado? Continua