quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Análise contrapõe duas versões de Grande Sertão: veredas

Via Agência USP de Notícias
Por Paloma Rodrigues - paloma.rodrigues@usp.br
27.09.2011



Oralidade é forte característica da literatura
 rosiana, o que dificulta a tradução
A literatura de Guimarães Rosa impõe uma série de desafios para a tradução. Em sua tese de doutorado Traduzir é muito perigoso – as duas versões francesas de Grande Sertão: veredas – historicidade e ritmo, a professora Márcia Valéria Aguiar, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, mostra como a perspectiva adotada pelo tradutor faz diferença em seu trabalho. Em análise de duas traduções francesas, a primeira de 1960 e a segunda de 1991, ficou clara a diferença na montagem dos textos e na concepção dada a obra. “Não dá para avaliarmos uma tradução por meio de uma comparação direta com a versão na língua matriz. Antes de criticar o que foi feito, temos que descobrir a partir de que perspectiva a tradução se deu”.

Segundo Márcia, não se pode pensar que traduzir é uma ação que consiste em passar de uma língua para outra automaticamente. No caso de Rosa, os tradutores contaram com a ajuda direta do autor, o que facilitou e norteou os trabalhos. Cabe destacar que ele nada impunha: sugeria termos, recolocava frases, mas sempre respeitando a opinião do tradutor e sua decisão final. “Rosa queria muito ser traduzido, mas sabia da dificuldade dessa tradução. Ele dizia: ‘eu escrevo para o infinito’ e isso queria dizer que ele não se limitaria a uma única língua”, diz. As correspondências de Rosa com tradutores alemães, americanos, franceses e italianos foram um dos fundamentos do trabalho de doutorado e serviram para precisar como ele concebia a própria obra e o que esperava de seus tradutores. Esse processo de auxílio de Rosa, por intermédio das correspondências, foi base para o trabalho de Márcia e serviu para apontar as dimensões da obra.

Durante a produção da versão de 1960, o tradutor Jean-Jacques Villard e Rosa trocaram inúmeras correspondências, base para a análise de Márcia. Rosa explica não apenas sua literatura, como questões da botânica brasileira, facilitando a aproximação e adequeção da língua francesa ao original em português. Villard forjou um Diadorim — título de Grande Sertão: veredas em francês — que foi comparado com um autor que subverteu a linguagem litetária clássica a partir da “língua falada”.

A tradução de Villard ajudou a impulsionar a figura de Guimarães Rosa na França. Villard aproveitou o léxico e a sintaxe francesa para deixar a versão mais próxima da oralidade. O uso de léxico comum, que se afastava do “empolamento” da literatura clássica, facilitou o processo de deslocamento da língua francesa, o que vai de encontro ao espírito da literatura rosiana. Continua