sábado, 20 de fevereiro de 2010

Considerações breves sobre a arte contemporânea e o papel das instituições

Via Itaú Cultural - Resenha - Março Abril 2009


Três obras que mudaram a forma de ver e entender a arte brasileira atual


Por Tadeu Chiarelli

Ao sair de algumas exposições em museus, galerias e bienais, muitas pessoas experimentam certo amargor relacionado à sensação de que não são cultas. A razão desse sentimento reside no fato de que muito daquilo que observaram não possui conexão com aquilo que, durante anos, foram ensinadas a entender como arte. Afinal, onde estão as pinturas e as esculturas que aprenderam a apreciar? Muitas vezes, inclusive, o amargor inicial é substituído por um sentimento de desprezo perante aquelas proposições "exóticas", agora vistas como empulhações, não merecedoras de nenhuma atenção. Está aí a razão para que muitos deixem de frequentar exposições de arte contemporânea.

Essa situação é lastimosa porque muito da produção recente possui conexões com questões atuais que afligem a todos, de uma forma ou de outra. Aqui, portanto, a pergunta: por que esse divórcio entre a produção atual e o grande público?

Dentre as várias respostas possíveis, creio que existam duas que podem auxiliar a, pelo menos, adentrar no problema: a primeira diz respeito a uma mudança na arte, ocorrida no século passado; a outra se refere a como as instituições culturais negligenciam essa mudança, quase sempre apresentando duas concepções distintas de arte como se fossem a mesma.


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Desde, sobretudo, o fim da Segunda Guerra Mundial, muitos artistas deixaram em segundo plano a relação que se fazia entre arte e objeto estético concebido dentro de padrões estabelecidos (pintura, escultura etc.). Eles passaram a desenvolver propostas em que o artista não mais operava dentro da necessidade de produção de objetos únicos e concebidos para realçar sua "genialidade" e competência, com base em parâmetros estabelecidos pela tradição (mesmo a moderna). A partir daquele período nota-se o avolumar de propostas em que o trabalho do artista, em vez de continuar circunscrito ao universo do "belo" (mesmo que esse último conceito já houvesse se expandido em suas significações), passa a operar em relação a outras demandas socioculturais. Tão ou mais importante do que seguir as preocupações inerentes às vertentes estéticas anteriores, começa a surgir o imperativo de posicionar-se claramente em relação às diversas instâncias sociais, usando objetos e procedimentos que até então não faziam parte do universo artístico estabelecido.

A partir desse paulatino abandono das estéticas tradicionais (e, por conseguinte, das modalidades já citadas), surgirão inúmeras possibilidades de propostas, o que só aumentaria, é verdade, a sensação de não entendimento do público. Para diminuir esse fosso, talvez fosse necessário buscar os primeiros sinais dessas transformações. Assim seria resgatada, mesmo que de forma breve, a passagem da produção artística de uma circunscrição a questões puramente estéticas para um campo de experiências em que o observador é chamado a participar não apenas com o olhar, mas com outras ferramentas de percepção.

Se tomarmos o caso brasileiro e, dentro dele, três artistas, serão demarcados pontos notáveis dessa passagem que ainda se processa. São eles Hélio Oiticica, Nelson Leirner e Cildo Meireles. Continua


Tadeu Chiarelli é crítico de arte, curador e professor do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.