quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Argentinos expostos ao herbicida glifosato usado em transgênicos se queixam de doenças

Do Le Monde, no UOL Notícias
Via EcoDebate
10.08.2011

Câncer, leucemia, malformações fetais, abortos espontâneos, problemas respiratórios, oculares e dermatológicos: é interminável a lista de doenças das quais os habitantes de San Jorge se dizem vítimas.

A 600 quilômetros de Buenos Aires, com seus 25 mil habitantes, San Jorge é um agradável vilarejo de Santa Fe, uma das mais ricas províncias agrícolas da Argentina. No bairro pobre de Urquiza, somente uma rua de terra separa a casa de Viviana Peralta dos campos de soja onde a pulverização de pesticidas se faz por avião. Foi somente quando ela percebeu que Ailen, sua filha de um ano e meio, estava tendo crises agudas de asma cada vez que o avião sobrevoava sua casa, que a sra. Peralta fez a associação. No hospital, uma pediatra confirmou a presença de glifosato no sangue de Ailen. Reportagem de Christine Legrand, Le Monde.

O glifosato é o princípio ativo do Roundup, o herbicida elaborado e comercializado pela empresa americana Monsanto, cujo uso se popularizou a partir de 1997 na Argentina, pioneira na América do Sul. Em contato com o herbicida, todas as ervas daninhas morrem, exceto pela soja RR (Roundup Ready), a soja transgênica tolerante ao Roundup criada pela Monsanto.

Em San Jorge, a incidência de câncer aumentou 30% em dez anos. Depois de uma pulverização, os habitantes contam que seus lábios ficaram arroxeados e suas línguas incharam. Frangos morreram. Gatos e cachorros perderam o pelo. Abelhas desapareceram e os pássaros foram rareando.

Depois de ter sido dispensada pelo prefeito, Viviana Peralta resolveu apelar para o tribunal. Um juiz a ouviu. Ele aceitou receber sua queixa, bem como a de 23 famílias do bairro, contra o governo argentino, as autoridades provinciais e os produtores de soja.

No dia 17 de março de 2009, a Justiça deu um veredito histórico ao proibir qualquer pulverização a menos de 800 metros das casas caso ela seja feita com a ajuda de “mosquitos”, os tratores que empregam asas com vários metros de extensão, e a menos de 1,5 quilômetro se feita por avião.

“O glifosato não é água benta, como quiseram fazer a gente acreditar!”, se revolta Carlos Manessi, agrônomo e coordenador para a província de Santa Fe da campanha nacional contra as pulverizações. Ele ressalta que a comercialização do Roundup foi autorizada na Argentina sem análise científica prévia do governo, e “somente a partir de um relatório da Monsanto em inglês, nunca traduzido.”

Os produtores locais de soja estão convencidos de que o Roundup é inofensivo. “Proibi-lo seria como proibir a aspirina”, diz um deles. A febre do “ouro verde” tomou conta da maior parte das províncias argentinas, incentivada pela demanda dos países emergentes e da disparada nos preços no mercado mundial. A Argentina é a terceira maior produtora de soja, e a primeira exportadora de produtos derivados (óleo e farinha). A soja RR ocupa mais da metade das terras cultivadas, ou seja, 17 milhões de hectares. Continua