quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Caos e medo em Caetité: a violação dos direitos humanos. Entrevista com Marijane Lisboa

IHU On-line/Via EcoDebate
19.10.2011

A Unidade de Concentrado de Urânio das Indústrias Nucleares do Brasil – URA-INB, “que minera e transforma urânio mineral em licor de urânio e este em concentrado de urânio, a principal matéria-prima do combustível nuclear”, entrou em funcionamento há uma década no município de Caetité, na Bahia e desde então aumentam as denúncias de crimes ambientais e violação dos direitos humanos. Nesses dez anos de atuação, “registraram-se muitos acidentes, objeto de autuações e multas dos órgãos federais e estaduais”, diz Marijane Lisboa, autora do relatório sobre o vazamento de urânio na cidade baiana. Entre os desastres ambientais, a pesquisadora menciona que já “transbordaram cinco milhões de litros de licor de urânio das bacias de sedimentação para o meio ambiente. (…) Entre janeiro e junho de 2004, a bacia de barramento de ‘finos’ transbordou sete vezes, liberando efluentes líquidos no Riacho da Vaca. O último vazamento de substância oleosa (solvente com urânio) custou à INB uma multa de um milhão de reais, em setembro de 2010”.

Ao visitar as comunidades que residem proximamente à mina de urânio, Marijane Lisboa ouviu diversas queixas em relação à falta de informações sobre os impactos ambientais e sociais. “Essas populações temem estarem sendo envenenadas devido à proximidade da mina e se alarmam com a grande frequência de mortes por câncer na região. (…) Todas as comunidades se queixaram de uma súbita falta de água, que inviabiliza suas atividades agrícolas e domésticas, como lavar roupa e cozinhar. Eles relacionam essa diminuição súbita da água com a abertura da mina dez anos atrás, pois foi aí quando começou o problema. Quando a INB se implantou no local, ela assinou contratos com vários agricultores para perfurar poços em suas propriedades e dividir o uso da água. Desde então muitos desses poços estão secos”, relata.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail para a IHU On-Line, Marijane Lisboa enfatiza que ainda não há uma solução segura para as milhares de toneladas de rejeitos radioativos gerados em todo o mundo. “Todas as usinas nucleares podem falhar e há um número enorme de acidentes menores, que não chegam às páginas dos jornais, mas que mostram os riscos intrínsecos à geração de energia nuclear. Em resumo, a energia nuclear é perigosa, cara e pouco eficiente e provavelmente só foi desenvolvida no mundo porque servia de biombo aos programas militares paralelos”.

Marijane Lisboa é uma das fundadoras do Greenpeace Brasil, onde coordenou campanhas nas áreas de transgênicos, resíduos sólidos e poluição do ar, e é ex-secretária de Qualidade Ambiental de Assentamentos Humanos – SQA do Ministério do Meio Ambiente. É graduada em Sociologia, pela Freie Universität Berlin, e doutora na mesma área pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, instituição na qual leciona. É membro do Conselho Deliberativo da Associação de Agricultura Orgânica – AAO, da Rede Brasil Ecológico Livre de Transgênicos e Agrotóxicos e da Rede Brasileira de Justiça Ambiental. Autora do livro Ética e cidadania planetárias na era tecnológica (Civilização Brasileira), também realiza consultorias para órgãos europeus e traduções de literatura científica e ficção alemã para o português.

Confira a entrevista.