Por Raquel Cozer
06.julho.2011
Antonio Candido, o mais importante crítico literário do País, acaba de dar uma raríssima entrevista coletiva na Pousada do Pardieiro, onde está hospedado em Paraty. Fizeram perguntas, entre outros, os repórteres Miguel Conde, do Globo (ele fez a maior parte das questões sobre crítica literária); Fábio Victor, da Folha; e Bira, do Estadão. Eu fiz lá só umas três perguntinhas, porque eu tava tuitando algumas coisas que ele falava, e não sou tão polivalente. =P
Ele reclamou que jornalistas sempre mudam o que ele fala, então, em respeito a ele, resolvi colocar aqui a íntegra da entrevista.
Este é um post in progress. Vou salvando conforme for tirando a gravação, ok? (a segunda metade da entrevista vai num próximo post)
Sobre o suspense em relação à participação na Flip
É fácil explicar. Eu sou muito idoso. Daqui a uns dias faço 93 anos. E considero a minha vida intelectual já completamente encerrada. Sou um sobrevivente. Não dou entrevistas, não dou cursos, não publico mais nada. Mas acontece o seguinte. Eu fui muito amigo do Oswald de Andrade. Eu e Oswald de Andrade começamos, tínhamos boas relações, depois escrevi uns artigos sobre ele que ele não gostou. Ele desceu a lenha em mim, e ele era terrível, me chamou de mineiro malandro. Mas depois eu achei que tinha sido um pouco injusto nos artigos, então fiz um ensaio sobre Oswald de Andrade, e ele gostou. Aí ficamos amigos e amigos mesmo. Fomos muito amigos. Inclusive eu fui padrinho de um filho dele, que infelizmente morreu com 20 anos num desastre de automóvel.
Eu vim aqui pelo seguinte. Porque a filha dele, a Marília, amiga de infância da minha filha, pediu e eu achei que eu sou provavelmente o último amigo vivo do Oswald de Andrade. Não sou da geração dele, sou 30 anos mais moço que ele, quase. Acho que sou da geração seguinte. Então eu achei que eu talvez tivesse obrigação de contar como é que eu e a minha geração víamos aquela personalidade vulcânica do Oswald de Andrade. Combinei com o José Miguel Wisnik, meu aluno, fez mestrado comigo, doutorado, meu grande amigo. Zé Miguel falará sobre como a geração dele viu Oswald. Só faltou uma pessoa da geração de Oswald de Andrade, mas aí… Não é possível mais. Eu vim para dar o meu testemunho.
Eu vim para dar meu testemunho por causa disso, porque só quem conheceu Oswald de Andrade pessoalmente pode testemunhar sobre a personalidade raríssima que ele tinha.
Sobre se eventos literários como a Flip podem prejudicar a discussão literária propriamente dita
É possível. Claro. A minha visão é uma visão de amigo que quer mostrar como… Eu não vou falar nem sobre a obra dele, nem sobre a biografia dele. Vou falar sobre a personalidade literária dele. E a relação que essa personalidade literária tem eventualmente com a obra. Esse é o meu tema. Depois o Zé Miguel Wisnik falará sobre como a geração dele viu Oswald.
Eu vim por causa disso. Enfrentei essa complicada serra de Paraty, que não é brincadeira.
O que distinguia o Oswald que a geração dele conheceu do Oswald que as novas gerações conhecem
A única coisa que tem de realmente própria é o contato pessoal. Conviver com aquela pessoa, ver aquela pessoa fazer piada, almoçar, jantar, ficar bravo, xingar os outros, fazer as pazes, estar com dinheiro, estar sem dinheiro, isso foi o que eu vi. O cotidiano. Nada de extraordinário. Mas Oswald de Andrade, dada a personalidade dele, tornou-se um mito. Inventava-se coisas. Inventava-se que ele tinha um filho chamado Lança Perfume Rodo Metálico (foi isso o que eu entendi da gravação). Aí diziam: Não, não é esse. É Rolando pela Escada Abaixo. Contava-se que ele tinha roubado uma normalista à luz do dia na escola normal. A personalidade dele chamava essa… Ele era mitológico. É que ele fazia o que lhe passava pela cabeça. Continua