quinta-feira, 18 de abril de 2013

Mundo atual e subjetividade: um desafio ao psicanalista - Por Marcio de F. Giovannetti

Via Ciência e Cultura - SBPC
v.55 n.4 São Paulo out./dez. 2003

Por Marcio de F. Giovannetti

O que é o mundo atual? Difícil de definir, o mundo. Mas a palavra atual nos coloca de chofre no centro da problemática de hoje. Em que momento começa algo como o 'mundo atual'? No assassinato do arquiduque em Sarajevo? Na Revolução Russa? No Reichstag? No ataque a Pearl Harbor? Na bomba de Hiroshima? Na chegada do homem à lua, coincidindo com a revolução sexual do Ocidente e os movimentos feministas? Na conquista do espaço cibernético? Na queda do muro de Berlim? Na globalização econômica? Na clonagem da ovelha Dolly? Em 11 de setembro de 2001?

Se há algo que permanece hoje em nosso mundo é a idéia de pós. Tudo o mais parece extremamente provisório. A palavra atual parece significar hoje e apenas hoje. Aqui e agora. Ou melhor, apenas agora, pois a própria idéia de "aqui" é absolutamente questionável diante da internet ou de um aparelho de televisão. Noite e dia parecem ser coisas de outros tempos, com todas as conseqüências que isso traz para o animal humano, sonhador e dependente que é de seus sonhos, conforme nos mostrou Freud no início do século XX. Não por acaso, surge alguém como Paul Virilio, um estudioso da velocidade, que trabalhando com as questões relacionadas às catástrofes, acaba por criar o conceito de estética do desaparecimento para caracterizar a perspectiva desse momento histórico. Em uma palavra, poderíamos dizer que o que há de mais característico no mundo de hoje é o desaparecimento da permanência. Tudo se volatiliza. Tudo é descartável. Mas, paradoxalmente, há um aumento da expectativa do tempo da vida humana. Quanto mais tempo vive o homem, menor o tempo de cada uma de suas coisas, sejam elas artefatos, produções culturais ou conceitos científicos. Ser estranho esse, o homem...


Temos algo que se aproxima a uma idéia, a uma definição de mundo atual: é o mundo cujo criador é o homem. Começa-se a escrever um "Novíssimo Testamento". Por isso a proliferação de novas religiões e uma reafirmação fundamentalista das antigas. Por isso o aparecimento diário de novos profetas sejam eles à moda antiga ou travestidos de ídolos televisivos ou de filósofos da pós-modernidade. Quando Walter Benjamin contrapôs a notícia do jornal à narrativa histórica, não tinha a mínima idéia de que hoje a narrativa jornalística, por ter a duração de 24 horas, chega a ser quase que clássica se comparada aos noticiários "ao vivo" de nossas TVs e às notícias de última hora da internet. Em minutos, criamos e destruímos um pedaço deste novo mundo, admirável como o nomeou Aldous Huxley. Mas apenas admirável: uma miragem impossível de ser usufruída, digerida. Pois as alucinações só satisfazem os desejos e as necessidades por um curto período de tempo.

Veja a matéria completa.