quarta-feira, 19 de março de 2014

Mulher arrastada por PMs é o mal banalizado

Via blog do Josiasm de Souza
18.03.2014

Ao analisar a história do criminoso nazista Adolf Eichmann, a filósofa alemã Hannah Arendt chamou de “a banalidade do mal” os signos de pretensa normalidade de que se revestiam o planejamento e a execução do envio de levas de judeus para os campos de extermínio. Eichmann era visto como um bom funcionário, zeloso cumpridor de ordens. Numa palavra: era um sujeito normal.
Corta para o morro da Congonha, bairro de Madureira, zona norte do Rio de Janeiro. Manhã de domingo. A auxiliar de serviços gerais Cláudia da Silva Ferreira, 38 anos, mãe de quatro filhos, mulher de um vigilante, saiu de casa para comprar pão e mortadela. A caminho da padaria, levou dois tiros —um no pescoço, outro nas costas. Tombou.
Abre parênteses: as versões sobre o que aconteceu minutos antes são divergentes. Na versão dos agentes do Estado, Cláudia atravessou uma troca de tiros entre policiais e traficantes. No relato de familiares e vizinhos, não houve tiroteio. Só a polícia atirou na direção de Cláudia. Fecha parênteses.
Dois subtenentes e um soldado da Polícia Militar carioca aproximaram-se de Cláudia. Estirada no chão, ela sangrava. Os policiais a recolheram. A pretexto de prestar-lhe socorro, enfiaram-na no porta-malas de uma viatura. E partiram, com a baleada a sacolejar no compartimento de bagagem.
Imterrompa-se por um instante a narrativa para sugerir ao leitor um exercício singelo de imaginação: suponha que uma moradora bem-nascida da zona Sul resolvesse sair do seu apartamento chique em Ipanema para comprar pão na panificadora da esquina. Imagine essa moradora branca de um bairro elegante sendo socorrida por policiais depois de levar dois hipotéticos tiros. Ela seria enfiada no porta-malas? Improvável. Seria confortavelmente acomodada no banco de trás da viatura. Talvez chamassem para ela uma ambulância.
CONTINUA!