Via Outras Palavras
Por Antonio Martins
06.08.2013
Fracking é um processo ainda quase desconhecido no Brasil. Empregado cada vez mais largamente nos Estados Unidos, é visto, lá, como uma das apostas para recobrar “soberania energética”. Consiste em injetar, em certas regiões do subsolo, água, areia e um coquetel de produtos químicos, em altíssima pressão. Permite recuperar depósitos de petróleo ou gás existentes em rochas subterrâneas, mas que não podem ser extraídos por métodos normais de extração. Agora, o fracking pode tornar-se conhecido, em todo o mundo, por outros de seus produtos. Veto total à produção de evidências a respeito de seus efeitos sobre o Ambiente e a Saúde. Silêncio forçado, imposto inclusive a crianças, em troca de dinheiro. Leis adotadas, sob forte influência de lobbies empresariais, para silenciar também os médicos. Em síntese, novas formas de bloquear três elementos essenciais da democracia: informação pública, transparência e possibilidade de influenciar a formulação de leis.
O último episódio de censura veio à tona ontem, no site norte-americano Alternet e no jornal londrino The Guardian. Em audiência judicial, um casal — Chris e Stephanie Hallowich, do Condado de Washington, na Pennsylvania — revelou ter assumido, em acordo judicial com uma operadora de fracking, cláusula que os obriga a silêncio, até o fim da vida, sobre os danos causados pelo processo a sua saúde. A censura perpétua estende-se, segundo os termos do contrato, a seus filhos, então com sete e dez anos de idade.
Em entrevista ao Alternet, Sharon Vion, ativista da organização Earthworks, que se opõem ao fracking, explica por que este tipo de pressão é eficiente. O casal Hallowich vivia em uma pequena chácara, próxima a um dos locais em que se adotava este tipo de extração. Depois que os trabalhos começaram, a família passou a apresentar sintomas como queimação nos olhos, ulcerações na garganta, dores de cabeça e ouvidos. A água da propriedade ficom contaminada. A empresa ofereceu-se para comprá-la, por 750 mil dólares. Impôs, porém a cláusula de silêncio. O casal aceitou-a, para poder mudar-se. O caso veio à tona por pressão de um jornal local e porque os Hallowich estão preocupados com a impossibilidade prática de calar as crianças.
Há centenas de acordos deste tipo, continua Sharon. E graças ao silêncio das vítimas, a indústria do fracking tem sido capaz de alegar, em juízo e em audiências legislativas, que “não há evidências concretas” da contaminação. Seria, certamente, fruto de exageros… A mesma desculpa é adotada por autoridades favoráveis à extração.
Um terceiro texto, na revista The Atlantic, revela que é ainda mais vasta a intervenção, nas decisões políticas, das empresas de fracking — entre elas, a Halliburton, fortemente ligada ao Pentágono e à guerra contra o Iraque. Alegando “segredos industriais”, obtiveram, do Congresso, o direito de não revelar, com exatidão, que mistura de produtos químicos injetam no solo. Estão desobrigadas de obedecer, também, dispositivos que exigem transparência em relação aos riscos de contaminação da água. Sabe-se já que entre os compostos estão alguns de alta toxicidade, como benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno. Em doses baixas, produzem o tipo de sintomas sentido pelos Hallowich. Com o tempo, ou dependendo da dosagem, causam câncer.
Talvez o caso mais bizarro de silêncio forçado seja, porém o que envolve os médicos da Pennsylvania. The Atlantic revela que o legislativo estadual aprovou, no ano passado, lei que determina às empresas de fracking fornecer, a estes profissionais, informações necessárias a seus diagnósticos. Porém, impõe-se uma cláusula de confidencialidade. Os médicos não podem revelar o que souberam das operadoras a ninguém — nem mesmo aos pacientes que estão tentando tratar…
É de estranhar, nestas condições, que tantos vejam tal tipo de “democracia” como farsa?