quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O aumento da violência escolar - Editorial do O Estado de São Paulo


JC e-mail 4672, de 26 de Fevereiro de 2013.
O aumento da violência escolar


Editorial do O Estado de São Paulo

Repreendido por mau comporta­mento, um aluno da 6.ª série do en­sino fundamental de uma escola pú­blica de Diadema jogou um va­so contra o professor, atingin­do-o na cabeça. A agressão ocor­reu no ano passado e foi presen­ciada pela mãe do estudante. O caso resultou em boletim de ocorrência registrado numa de­legacia de polícia e, por causa da violência do agressor, que ti­nha na época 12 anos, conver- teu-se num dos exemplos mais citados nos estudos de órgãos públicos e fundações privadas da área educacional sobre os fa­tores responsáveis pelo aumen­to da violência escolar.

Em 2011, segundo dados do Ministério da Educação, quase 4,2 mil professores de portu­guês e matemática da 5.ª e da 9.ª séries da rede pública e pri­vada de ensino fundamental contaram ter sido agredidos fi­sicamente por alunos dentro das salas de aula, nos corredo­res ou na saída dos colégios. O número representa 1,9% dos 225 mil docentes que respon­deram a um questionário ane­xado à última Prova Brasil. Tra­ta-se de um exame aplicado a cada dois anos nas escolas pú­blicas urbanas pelo Ministério da Educação.

A Prova Brasil faz parte do Sistema Nacional de Avaliação do Rendimento Escolar e seus resultados entram no cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Na Prova Brasil de 2007, 6,6 mil professores afirmaram ter sido agredidos por aluno e outros 1,9 mil testemunharam estu­dantes portando armas de fo­go dentro das escolas. Na Pro­va Brasil de 2011, mais de 9 mil docentes informaram ter visto estudantes portando facas e ca­nivetes em sala de aula. Pelas estatísticas do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), as agressões aos do­centes estão crescendo cerca de 20% por semestre. Entre 2008 e 2011, a entidade recebeu 157 denúncias de agressão, roubo, vandalismo e ameaças de morte em escolas paulistas.

Além dos ferimentos físicos, as agressões geram depressão, síndrome do pânico e estresse pós-traumático nos professo­res. Para tentar coibir a violên­cia escolar, as entidades sindi­cais do professorado criaram canais para receber denúncias. Entre 2011 e 2012, o Sindicato dos Professores de Minas Ge­rais recebeu uma denúncia de violência a cada três dias.

Em todo o País, colégios pú­blicos e privados estão ofere­cendo cursos de conciliação, de mediação e de justiça restaurativa para alunos e professo­res. Também investem na for­mação de pedagogos e dirigen­tes escolares preparados para fomentar o diálogo e aproxi­mar os professores do univer­so social e cultural dos alunos. No Rio de Janeiro, professores de 150 escolas - entre elas os melhores colégios particulares do Estado, como o Teresiano e o São Bento - participaram de cursos oferecidos pelo Tribu­nal de Justiça. Para a responsá­vel pelos cursos, desembarga­dora Leila Mariano, a sentença judicial não basta para atenuar a violência escolar. "Na escola, as relações são continuadas. A professora e o aluno que bri­gam estão ali no dia seguinte. Se a gente não resolver o pro­blema emocional deles, a ques­tão não vai parar aí", afirma.

Essas medidas, contudo, têm se revelado insuficientes para coibir a agressividade dos alu­nos e conter a escalada da vio­lência nas escolas. "A violência física é a ponta de um iceberg de outras violências que aconte­cem e não são tratadas. Nin­guém dá um soco do nada. Co­meça com olhares, xingamentos e empurrões", diz o pesqui­sador Renato Alves, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, depois de lembrar que as escolas já não se preocupam mais em estimular o bom rela­cionamento, como no passado. O problema estaria na ênfase excessiva no vestibular, que pri­vilegiou o individualismo em detrimento do estímulo à con­vivência. "Temos uma educa­ção do século 19 para alunos do século 21, com uma linguagem que não chega aos jovens", afir­ma Miriam Abramovay, da Fa­culdade Latino-Americana de Ciências Sociais.

No ensino fundamental, a violência escolar tornou-se um problema tão grave quanto o da má qualidade da educação. E não é só por meio da oferta de cursinhos de mediação que ele será equacionado.