Por Josias de Souza
Foto: Luiz Alves
19.04.2012
Realizou-se na Comissão de Seguridade Social da Câmara um debate revelador. A sessão foi convocada para discutir a encrenca dos implantes de mamas de silicone de duas marcas: a francesa PIP e a holandesa Rofil. Representantes de entidades médicas declararam-se preocupados com o risco de “desabastecimento” dos produtos no mercado brasileiro. A escassez decorre de resolução da Anvisa que tornou draconianas as regras desse comércio.
Chama-se Denis Calazans um dos doutores que foram ao microfone da comissão. Preside a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Disse que, no curto prazo, as restrições impostas pela Anvisa são inviáveis. Queixou-se nos seguintes termos: “O desabastecimento deve se agravar e os prejudicados são a classe médica e a população.” Curioso, muito curioso, curiosíssimo.
Até onde a vista consegue alcançar, 24,5 mil próteses mamárias registraram problemas. Vazaram depois de implantadas no organismo. No Brasil, as mulheres que carregam no peito próteses PIP e Rofil somam 12,5 mil. Por ora, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) recebeu 110 notificações de rupturas. Problemas reportados pelas pacientes, não pelos médicos. Em muitos casos, a substituição será custeada pelo SUS.
Foi contra esse pano de fundo que a Anvisa apertou o garrote. Primeiro, proibiu a comercialização dos implantes inseguros. Depois, numa resolução de 22 de março, regulamentou o balcão. Agora, antes de ir à prateleira e ao corpo das mulheres, os produtos terão de ser certificados pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia). Passarão por testes de composição e resistência.
Um dos signatários do requerimento de convocação da sessão, o deputado Eleuses Paiva (PSD-SP) expôs, em português direto, os motivos que o levaram a abrir o debate sobre próteses: “O que pedimos ao presidente da Anvisa é que tenha bom-senso, a fim de que a norma não inviabilize o desejo das mulheres de colocarem próteses.”
Presente, o dirigente da Anvisa, Dirceu Barbano (na foto lá do alto), respondeu de forma singela: “Se houver diminuição da disponibilidade, vamos ficar felizes porque serão menos produtos de má qualidade no mercado.” Para ele, só haverá escassez de implantes se os fornecedores não tiverem próteses de comprovada qualidade para fornecer à clientela.
São de 2009 as primeiras notícias sobre o vazamento de próteses em quantidade acima do razoável. Os doutores silenciaram. A Anvisa só tomou providências quando os incidentes ganharam as proporções de flagelo. Nesse cenário em que se mistura a aética e a inepcia, o debate da Câmara parece enviesado. A platéia esperava que os congressistas entrassem na briga do lado das pacientes.