terça-feira, 6 de novembro de 2012

Região da Amazônia ganhará 15 novas usinas hidrelétricas


JC e-mail 4617, de 05 de Novembro de 2012.
Região da Amazônia ganhará 15 novas usinas hidrelétricas


Demanda até 2015 exige 30 novas instalações em todo o Brasil.

A oferta de energia elétrica no País tem de crescer 42.600 megawatts (MW) nos próximos dez anos, e o Brasil vai colocar em operação entre três e quatro usinas hidrelétricas por ano para atender à demanda. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) já planejou a entrada em operação de 34 novas usinas hidrelétricas até 2021, sendo 15 delas na Amazônia Legal.

Para Maurício Tolmasquim, presidente da EPE, ampliar a oferta de energia hidrelétrica é condição básica para o desenvolvimento econômico, e a instalação de usinas nos rios amazônicos é inevitável. "Não podemos abrir mão de construir hidrelétricas. Preservar o meio ambiente não é uma decisão excludente. É preciso achar um meio de a hidrelétrica ajudar a preservar", diz Tolmasquim.

A EPE propõe construir hidrelétricas do tipo plataforma, que depois de prontas ficariam isoladas na floresta, acessíveis apenas por helicóptero, inspiradas na extração de petróleo no mar. Mas, durante a construção, reconhece Tolmasquim, é impossível não abrir estradas e criar acampamentos para os operários. "Não tem como fazer sem construir estradas, mas elas podem ser reflorestadas."

A inevitabilidade da construção de novas hidrelétricas, principalmente na Amazônia, tem como premissa a necessidade de atender ao consumo cada vez maior de energia no País. O brasileiro ainda consome três vezes menos que o americano. Por isso, a tendência é consumir mais. "A sociedade tem de decidir se ela quer ser abastecida de energia elétrica. E a alternativa às hidrelétricas são usinas térmicas a óleo, gás natural ou carvão. É uma energia muito mais cara, que prejudica mais o meio ambiente", afirma o diretor-executivo da Brasil Hydro, Flavio Miguez de Mello.

Se mantido sem alterações estratégicas, o estudo da EPE para 2021 prevê que, à exceção das hidrelétricas, que representarão 12,6% da oferta de energia total no País, a participação das demais fontes renováveis passará dos atuais 1,4% para apenas 1,6%. Com 2.200 horas de insolação, o Brasil sequer incluiu a energia solar no planejamento energético até 2021. E quando se trata de ventos, o volume no Brasil é duas vezes maior do que a média mundial.

Para se discutir o futuro das hidrelétricas é preciso também discutir o padrão de consumo de energia no país e o gerenciamento da oferta. Dois estudos recém-lançados por organizações não governamentais (ONGs) apontam caminhos. "É preciso quebrar o paradigma de grandes hidrelétricas", diz o professor Paulo Henrique de Mello Sant'Ana, da Universidade Federal do ABC (UFABC), coordenador de um estudo patrocinado pela WWF-Brasil.

Sant'Ana lembra que países como a Dinamarca têm 30% de sua energia gerada pelos ventos e que a Alemanha, com muito menos sol que o Brasil, já é o terceiro país do mundo em energia solar, atrás de China e Estados Unidos. "No lugar de expandir a oferta, temos de aprender a gerenciar a demanda. Estamos diante de uma revolução energética, e o Brasil não está olhando para frente", diz.

Para o professor, alternativas para reduzir o ritmo frenético de construção de novas usinas estão em programas capazes de mudar o padrão de consumo.

Ponto frágil - Dados da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava) mostram que 8% da energia produzida no Brasil se destinam apenas ao chuveiro elétrico. Isso corresponde a 15 mil MW no horário de pico, entre 17h e 22h.

Segundo a Abrava, cada metro quadrado de coletor solar instalado para aquecer água pode evitar 56 metros quadrados de área inundada por hidrelétricas. No estudo "O Setor Elétrico Brasileiro e a Sustentabilidade no Século 21", patrocinado por cinco ONGs, incluindo o Greenpeace, o consultor em planejamento energético Roberto Kishinami afirma que o país precisa urgentemente planejar o aumento de sua eficiência econômica.

Ele lembra que a eficiência energética dos motores elétricos de uso industrial passou de 39,8% em 1984 para 47,1% em 2004. Segundo ele, um programa que reunisse os fabricantes de motores e instituições de pesquisa poderia, a curto prazo, promover a troca dos equipamentos antigos por outros com maior eficiência, reduzindo o custo e a necessidade de uso de energia nas indústrias, que respondem por metade do consumo total.

"A política brasileira é de gerar e distribuir energia no atacado, mas a tendência é descentralizar. O uso da energia solar é descentralizado, por domicílio ou empreendimento", explica Marcelo Mesquita, especialista em gestão de energia e consultor da Abrava.

O consultor chama atenção ainda pelo fato de as hidrelétricas receberem investimentos de R$ 190 bilhões e os programas de eficiência energética alcançarem no máximo R$ 10 bilhões no período. Os investimentos em usinas eólicas e de biomassa receberam do PAC apenas R$ 9,7 bilhões.

Ao optar por produzir energia na Amazônia, distante dos centros de consumo, o País tem de investir mais em linhas de transmissão. Só em interligações e para usar a energia a ser gerada pelas usinas de Belo Monte, Teles Pires e Tapajós (a ser licitada em 2013) estão revistos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) investimentos de R$ 37,4 bilhões. A distância tende a agravar as perdas do sistema.

Segundo dados da EPE, o índice de perdas do setor elétrico, de 16,9% em 2012, chegará a 2021 em 16,1%, uma redução inferior a um ponto percentual. Para se ter uma ideia, no Chile esse índice fica em 5,6%; na Argentina em 9,9% e na Colômbia em 11,5%.

Os problemas nas linhas de transmissão têm sido apontados como os principais responsáveis pelos diversos apagões registrados no País. Em 2007, o Tribunal de Contas da União realizou auditoria para verificar as perdas e, no ano passado, o Ministério Público Federal abriu inquérito civil público para obrigar as autoridades a implementarem projetos eficientes que reduzam, efetivamente, as perdas energéticas.

O professor da Faculdade de Administração e Economia da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto, Eliezer Martins Diniz, afirma que as decisões sobre a construção de hidrelétricas ainda são tomadas com critérios unicamente econômicos.

"É preciso ter bom senso nesta hora. É importante gerar energia e reduzir a desigualdade social, mas preservar o meio ambiente é também evitar desigualdade entre gerações futuras. Falar em desenvolvimento econômico e social não pode ser um alvará para passar por cima de questões ambientais", afirma.

(Caderno Desafios Brasileiros - O Globo / O Estado de São Paulo)