JC e-mail 4053, de 15 de Julho de 2010.
Gigolôs de infrator, artigo de Roberto Smeraldi
"O texto do Código Florestal aprovado em comissão da Câmara promove o que de pior se pode fazer com a lei: premiar o descumprimento"
Roberto Smeraldi é diretor da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira. Artigo publicado na "Folha de SP":
Surpreendentemente, não é o Código Florestal que sai mais ameaçado pelo relatório aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, criada por iniciativa de deputados ruralistas. As principais ameaças são para o Estado de Direito e para a competitividade da agropecuária.
Após o alarde sobre as mazelas do Código, os parlamentares acabaram aprovando um texto que enfraquece um de seus pilares -a proteção de cursos d'água e solos vulneráveis-, mas não afeta de forma expressiva o arcabouço legal.
Claro, é paradoxal num país que contabiliza centenas de mortos e bilhões de prejuízo com aluviões, enchentes e deslizamentos. Mas não é o ponto principal. O texto promove o que de pior se pode fazer com a lei: premiar o descumprimento.
Propõe anistia de abrangência jamais concebida: não apenas perdão de todas atividades ilegais até 2008 -legitimando assim a expectativa de que isso se repita indefinidamente- mas também dispensa da recuperação dos ativos ilegalmente destruídos em imóveis até quatro módulos, ou seja, em qualquer lugar, pois um imóvel pode ser desdobrado pelo mesmo dono.
A proposta é uma afronta para os produtores rurais que trabalham dentro da lei. Há uns dias, o presidente da empresa brasileira líder mundial em celulose me questionou: "Por que nós respeitamos a reserva legal, faturamos R$ 28 bilhões por ano e distribuímos dividendos, enquanto outros seguem impunemente desmatando e até geram pouco emprego?". Continua