quinta-feira, 30 de maio de 2013
Universidades lançam cursos gratuitos on-line
JC e-mail 4736, de 29 de Maio de 2013.
Universidades lançam cursos gratuitos on-line
Jornal Valor Econômico traz reportagem sobre a aposta das universidades brasileiras nas plataformas de ensino on-line abertas ao público
Na esteira de universidades internacionais renomadas, como Harvard e Massachusetts Institute of Technology (MIT), instituições brasileiras de ensino superior têm apostado no desenvolvimento de plataformas de cursos gratuitos on-line, abertos ao público, os chamados Moocs (Massive On-line Open Courses). Embora universidades como USP, Unesp e Unicamp estejam lançando seus programas sem grande alarde desde meados do ano passado, a expectativa é que eles atinjam um público cada vez maior - e globalizado. Mesmo que as iniciativas sejam recentes, os coordenadores dos cursos vislumbram utilizar os Moocs como ferramenta para internacionalizar as faculdades brasileiras.
A Unesp e a Unicamp, por exemplo, pretendem legendar as aulas na internet em espanhol e inglês. As instituições geralmente colocam em seus sites materiais produzidos de forma independente pelos professores, com a infraestrutura tecnológica já existente para os cursos a distância. "Alguns dos nossos docentes já utilizavam videoaulas nas turmas semipresenciais, então resolvemos juntar todo o material e criar o nosso Mooc", afirma o professor Klaus Schlünzen Junior, coordenador do Núcleo de Ensino a Distância (Nead) da Unesp. O site Unesp Aberta, que traz módulos gratuitos e abertos para o público, foi lançado em junho de 2012 e conta com 72 cursos de diversas áreas - já assistidos por mais de 32 mil usuários.
Segundo Schlünzen, embora os Moocs ainda enfrentem diversos entraves, como a resistência do meio acadêmico em confiar na tecnologia para a disseminação do conhecimento, a tendência é que a educação faça cada vez mais uso de ferramentas digitais. Nesse sentido, é preciso estar preparado para acompanhar as demandas dos alunos em âmbito global. "O Brasil tende a caminhar para um modelo híbrido, que mistura tecnologia ao método presencial. A forma de aprendizagem deve se tornar cada vez mais individual, permitindo ao aluno mais mobilidade", diz o coordenador. Para ele, será possível, em um futuro próximo, assistir a diversos módulos em instituições diferentes e utilizar os créditos no histórico escolar, por exemplo.
Além disso, os cursos devem se tornar mais interativos. Hoje, a maioria dos módulos disponíveis na internet é composta de aulas expositivas gravadas em vídeo. O objetivo, contudo, é chegar a um modelo em que o aluno possa fazer perguntas ao professor e debater com colegas conectados naquele momento.
Nas grandes universidades internacionais que aderiram aos Moocs o sistema é parecido com o brasileiro, embora as instituições estejam "um passo à frente das nossas", conforme destaca Schlünzen. Lá, os vídeos publicados geralmente possuem ferramentas de interação com o usuário, como questões de múltipla escolha para serem respondidas durante a aula. Os professores também recebem dúvidas dos alunos e, em alguns casos, até emitem certificados de conclusão do módulo - embora ainda não tenham validade no mercado, pois não é possível comprovar que a pessoa que solicita o documento assistiu, de verdade, aos cursos.
A impossibilidade de verificar a identidade dos usuários impede que as universidades brasileiras emitam certificados de conclusão de um Mooc. Entretanto, as universidades públicas estudam meios de tornar isso possível. "O próximo passo é garantir que o aluno seja avaliado", destaca Marcelo Knobel, pró-reitor de graduação da Unicamp. Para ele, o maior entrave no Brasil é a infraestrutura. "Produzir o material que será publicado gratuitamente é caro e não há uma verba só para isso. Entretanto, é um investimento que traz benefícios. Temos vídeos que foram acessados por mais de 25 mil pessoas", diz.Knobel pondera que a modalidade ainda é utilizada no país de forma experimental, pois é uma ferramenta nova e que ainda gera polêmica no meio acadêmico. "O uso das tecnologias na educação é uma tendência inevitável", diz.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) tem apoiado iniciativas que envolvem Recursos Educacionais Abertos (REA) no Brasil - materiais de ensino e pesquisa licenciados sob domínio público, que podem ser utilizados ou adaptados por terceiros. A instituição acaba de lançar uma cátedra com a Unicamp que tem como objetivo tornar público e disponível em rede uma série de materiais de apoio para serem utilizados por professores em sala de aula. No que compete aos Moocs, especificamente, a organização ainda não apoia projetos no país, entretanto, reconhece que iniciativas que buscam disseminar conhecimento são importantes, principalmente em economias emergentes.
"O maior desafio hoje das ferramentas abertas é acompanhar a evolução do aprendizado. Os Moocs são viáveis no Brasil, mas precisamos descobrir ainda quem é esse público e desenvolver programas voltados às suas necessidades", diz Adauto Cândido Soares, coordenador de comunicação e informação da Unesco. No país, os Moocs poderiam, na opinião de Soares, ser úteis para os alunos que deixaram o ensino médio e ainda não cogitam seguir para as universidades.
Atrair futuros alunos para os cursos de graduação e pós-graduação pagos é um dos motivos que levaram a Fundação Getulio Vargas (FGV) a investir nos Moocs. Por meio da FGV Online, plataforma que existe há cinco anos e traz cursos pagos on-line, a instituição passou a divulgar 48 módulos gratuitos em diversas áreas, como direito tributário, sustentabilidade, inovação e gestão de pessoas. Cinco aulas, inclusive, estão legendadas em espanhol. "Queremos começar nosso projeto de internacionalização por meio do espanhol para atingir o público latino-americano. Depois pretendemos incluir legendas em inglês", explica Stavros Xanthopoylos, diretor da FGV Online.
Embora não seja possível mensurar quantos alunos a FGV conseguiu levar para os cursos presenciais utilizando os Moocs como chamariz, há diversos projetos em análise para desenvolver essa ferramenta, com expectativa de retorno financeiro. "O nosso MBA de RH on-line é pago e um dos mais acessados do site. Com base nisso, podemos abrir o curso gratuitamente, na internet, transformando-o em um Mooc. Quem quiser certificado, por exemplo, poderá pagar pelo serviço de tutoria e aplicação de provas presenciais. Há diversas oportunidades dentro dos módulos gratuitos e abertos ao público", afirma Xanthopoylos.
Ao todo, 16 milhões de usuários já acessaram os cursos online da FGV. Para os Moocs, que são, por definição, gratuitos, não é possível emitir certificado. Mas Xanthopoylos acredita que neste problema mora outra oportunidade de negócios. "Os alunos interessados em ter um documento comprobatório de conclusão do curso poderão, no futuro, submeter-se a uma prova presencial, que validará o conhecimento adquirido e comprovará que foi ele mesmo quem assistiu às aulas", complementa.
Com nove mil acessos por dia, o e-Aulas, site de cursos on-line gratuitos da USP, completa seis meses em maio. A iniciativa já ultrapassou a marca de mil módulos publicados. Destes, 780 partiram de aulas já gravadas para cursos semipresenciais da instituição. Outros 300 vieram de produções espontâneas do grupo de professores da maior universidade da América Latina. "Nos lançamos por último nessa onda de Moocs, mas queríamos garantir que conseguiríamos publicar um material extenso e de alta qualidade", diz Gil da Costa Marques, diretor de mídias digitais da USP. Ele explica que hoje é possível assistir a diversos módulos, mas o objetivo é abrir cursos inteiros. "Não queremos dar aulas de graça apenas sobre as leis de Newton. Queremos cursos completos sobre mecânica", diz.
Marques destaca, porém, que a produção de Moocs é mais complexa que a de aulas semipresenciais, pois é preciso dar aos alunos mais suporte. "O ideal seria o modelo de tutoria, mas como o curso é gratuito não é possível bancar um profissional para isso. Mas podemos tornar os vídeos mais dinâmicos e interativos, oferecendo materiais extras de apoio, testes, simulações de problemas", destaca.
Para o diretor de mídias digitais da USP, o ideal seria também dedicar um tempo para tirar dúvidas dos alunos, e não restringir os debates aos fóruns. "Uma sala virtual pode ter mais de 10 mil alunos, o que é bem diferente de uma turma presencial. Temos muito o que aprender ainda no que compete à produção de aulas virtuais para o grande público, mas é um passo necessário para a democratização e universalização do ensino", defende Marques.
(Carolina Cortez /Valor Econômico)