A primeira vez que li sobre o assunto pulseiras do sexo pensei “isso não pode ser sério”. Sou do tempo em que brincar de salada mista era o cúmulo da transgressão “sexual”. O selinho da brincadeira era o comentário do dia. Meninas corriam da história ao serem escolhidas. E tudo era uma grande e inocente encenação.
Agora os adolescentes aparecem com pulseirinhas de várias cores que, se arrebentadas por um garoto ou rapaz, impõem à moça uma “prenda”, do abraço à relação de fato. Algo está fora de ordem.
Uma menina de 13 anos teria sido violentada no Paraná por causa das tais pulseirinhas. Em Manaus, outro caso de agressão sexual terminou em morte e estaria ligado às pulseirinhas. Pulseira agora é licença para estuprar? É claro que não, você deve estar pensando, mas é a desculpa que o criminoso busca para escapar da punição e se colocar como convidado a uma relação consentida.
Quer um bom motivo para convencer a adolescente a jamais embarcar numa “brincadeirinha” dessas? A rua é um lugar mais perigoso do que a gente gostaria.
Conversei com a promotora de Execuções Penais do Ministério Público do Distrito Federal, Maria José Miranda. Com 17 anos de experiência, Maria José trabalha hoje no que ela chama de “esgoto penal”. Ela está encarregada da seção do MP que acompanha os condenados postos em liberdade por progressão da pena. Refém de um sistema falho, ela recomendou que Adimar, o pedófilo que matou seis meninos em Luziânia, Goiás, fosse monitorado de perto. Não conseguiu. Adimar violentou e matou enquanto gozava da liberdade concedida. “Eu vejo Adimares que não acaba mais”, diz, com um pesar na voz. “Adolescentes se acham imortais. Acreditam que podem beber que jamais ficarão bêbabos, que podem dirigir rápido que não baterão. Acham que nada acontece com eles”, diz. Mas num show, num ponto de ônibus, num shopping, pode ter um estuprador de olho na pulseirinha do sexo. Abaixo reproduzo trechos dessa conversa, bastante pesada, mas necessária. Espalhem.
Mulher 7×7 – Alguns crimes sexuais foram atribuídos ao uso das pulseiras do sexo. Como a senhora viu esses fatos?
Maria José Miranda - Os estupradores sabem que terão uma justificativa, entre aspas, afirmarão que foram convidados e, dependendo do porte físico da vítima, ainda dirão que não sabiam que era menor de idade. O estuprador usa isso como desculpa: a vítima quis. Quando entram as pulseiras, aí é que a defesa vai explorar o tema.
Mas a Justiça trata a mulher como culpada, como cúmplice?
Não. A defesa sempre alega isso, mas o Judiciário não tem acatado. O que eu acho que a Justiça deixa muito a desejar são as penas, se determina a pena mínima, fica muito próximo do mínimo. Por exemplo, no caso do Adimar, um dos desembargadores queria 7 anos e 6 meses pela violação de duas crianças. Quando a lei dos crimes hediondos foi derrubada no Carnaval de 2006, isso seria um ano e meio. Um estuprador que destruiu a vida de duas crianças. Eu não me conformo com isso.
O que aconteceu quando o Supremo derrubou a lei antiga dos crimes hediondos até que se editasse uma nova?
Quando o Supremo derrubou, ficou valendo o que o Código Penal estabelece para todos. Como estupro é um crime que pega no mínimo seis anos e, no máximo, quando entra a Lei das Execuções Penais dizendo que pode progredir o regime a partir do momento que cumprir um sexto, a partir de um ano tinha criminoso na rua. A nova lei dos crimes hediondos foi votada em 28 de março de 2007. Nesse tempo, 81 mil presos perigosos foram para a rua, muitos estupradores. Foi uma tragédia social. Essa “ausência” retroagiu e todos os condenados antes de 2006 foram beneficiados, e não só para os crimes desse período “sem lei”.
Agora que temos uma nova lei de crimes hediondos, o mínimo a ser cumprido são dois quintos, mas ainda é muito pouco. Quem é condenado a 30, só tem que cumprir 12. Continua
quarta-feira, 28 de abril de 2010
As pulseiras e os criminosos sem punição
Via Mulher 7x7 - Por Isabel Clemente - 27.04.2010