DEU EM O GLOBO
Diante da sucessão de tragédias causadas por enchentes e desabamentos em inúmeras cidades, além de estradas convertidas em corredores da morte, algumas levadas pela enxurrada, pode-se fazer várias análises sobre as causas de tantos fatos dramáticos.
Há quem prefira enfatizar os rigores meteorológicos, agravados pelo aquecimento das águas do Pacífico (El Niño).
Pode-se, no caso dos acidentes as estradas, também responsabilizar a imprudência ao volante. É impossível mesmo haver explicação única para tudo.
Mas há alguns pontos comuns nesse cenário de desastres. Um tem relação com a qualidade da atual representação política no país, e outro com a visão do Executivo federal das prioridades na aplicação das centenas de bilhões de reais arrancados da sociedade por meio de impostos escorchantes.
Ficam à mostra nesses desabamentos, quase sempre em favelas, urbanizadas ou não, a demagogia e o populismo de administradores públicos.
Existem políticos protetores de áreas ocupadas de maneira desordenada e ilegal — quando eles não são também os incentivadores de invasões.
Convertidas em curral eleitoral, as favelas são mais tarde urbanizadas pelo mesmo coronel urbano, responsável, depois, pela distribuição clientelista de títulos de propriedade.
Guardião do local, garantia de que não haverá remoções, nem em áreas de risco, ele não costuma aparecer quando protegidos seus são esmagados por toneladas de terra, pedras e entulho.
Uma das facetas dessas tragédias é, portanto, a existência de partidos interessados em arregimentar políticos “puxadores de voto”, sem qualquer preocupação em atrair eleitores em função de uma proposta programática competente, séria.
Uma legislação leniente com fichas-sujas e condescendente com a existência de legendas de aluguel sustenta essas aberrações.
Também não há causa única para as 455 mortes em estradas federais, registradas apenas no período dos feriados de fim de ano.
Mas é possível traçar uma relação de causa e efeito, em parte dessas tragédias, envolvendo a péssima qualidade das vias com uma política de gastos do governo centrada mais no custeio da máquina burocrática, nos salários do funcionalismo, na contratação de milhares de novos servidores, e no assistencialismo demagógico.
Quanto aos imprescindíveis investimentos na ampliação e na conservação da infraestrutura de transportes, fator determinante da segurança nas estradas, estes ficam no fim da fila das prioridades.
Os perigos para os brasileiros vão além das chuvas de verão.