Por Alex Sander Alcântara
30.11.2010
Estudo identifica alta frequência de estresse pós-traumático em mulheres que receberam diagnóstico da doença e indica que sintomas podem adiar ou evitar o tratamento (Wikimedia) |
Caracterizada por sintomas de evitação (como tentar evitar lembranças ligadas ao episódio), de hiperestimulação (irritabilidade, dificuldades de conciliar o sono e de concentração) e de revivescência (recordações aflitivas, recorrentes e intrusivas), o TEPT pode comprometer não só a qualidade de vida de pacientes com câncer de mama como a continuidade do tratamento.
É o que destaca uma pesquisa conduzida na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) que identificou o TEPT agudo em mulheres diagnosticadas com câncer de mama.
O estudo foi feito com 290 pacientes atendidas no Hospital Pérola Byington, na capital paulista, entre agosto de 2006 e março de 2007. Os sintomas do TEPT estavam presentes em 81% das mulheres diagnosticadas com câncer de mama.
A pesquisa investigou também fatores associados a não adesão (ou a não aceitação) aos tratamentos para o câncer de mama e apontou que pacientes que apresentaram sintomas do transtorno tiveram menor adesão.
Segundo o estudo, 13,3% dos pacientes com esse transtorno interromperam o tratamento após o primeiro ano de acompanhamento. De acordo com Julio Litvoc, professor do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP e coordenador da pesquisa, o TEPT não tem sido avaliado adequadamente pelos profissionais.
“Esse conceito é pouco utilizado pelos profissionais de saúde, por desconhecimento do transtorno e também por se valorizar as comorbidades associadas ao diagnóstico, como os transtornos de ansiedade, depressão e pânico”, disse à Agência FAPESP.
O estudo “Associação entre as respostas ao estresse em mulheres com câncer de mama e a adesão ao tratamento do câncer de mama” teve participação de Sara Mota Borges Bottino, coordenadora médica da Psiquiatria do Instituto do Câncer de São Paulo (ICESP), e recebeu apoio da FAPESP por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular.
A primeira parte do estudo investigou a prevalência e o impacto do TEPT e corresponde à tese de doutorado de Sara, orientada por Litvoc. Segundo ele, o estudo relaciona a epidemiologia à psiquiatria. “A ideia foi produzir um trabalho voltado para a reorganização dos serviços de atendimento”, salientou.
“O problema do diagnóstico é que as pacientes podem não manifestar os sintomas de maneira explícita, mas, ainda assim, desencadeá-los de forma a interferir no tratamento e na qualidade de vida. E o pior: não retornar ao médico”, disse Sara.
Segundo a psiquiatra, apesar de ser considerado um transtorno de ansiedade, uma das particularidades do TEPT é a imprevisibilidade. “A paciente não apresentava os sintomas relacionados à doença e, de repente, descobre-se doente após o diagnóstico”, apontou.
Assustadas, as pacientes evitam ter pensamentos sobre o câncer. Os sintomas de evitação se mostraram recorrentes em 58,2% dos casos. Segundo o estudo, os sintomas de evitação merecem maior atenção, porque podem ter consequências graves para as pacientes com câncer, que necessitam ir às consultas e fazer os exames pré-operatórios.
“Esse sintoma é entendido pela equipe médica como ‘negação’. Mas, como parte de uma síndrome de transtorno do estresse pós-traumático, o diagnóstico é relativamente novo”, indicou Sara. Já os sintomas de hiperestimulação e revivescência apareceram, respectivamente, em 63,1% e 59,6% das mulheres entrevistadas.
De acordo com Litvoc, a segunda parte do trabalho – a da adesão – terá continuidade. “Essa segunda etapa trouxe resultados significativos que nos preocuparam. Daremos continuidade a ela aplicando outros métodos”, apontou.