terça-feira, 22 de outubro de 2013

Governo gastou R$ 12 milhões com hospedagem de médicos cubanos durante curso preparatório


JC e-mail 4839, de 22 de outubro de 2013
Governo gastou R$ 12 milhões com hospedagem de médicos cubanos durante curso preparatório


Na versão original divulgada pelo Ministério da Saúde para o Mais Médicos, não havia previsão com este tipo de gasto

Documentos do Ministério da Saúde mostram que o governo já gastou R$ 12 milhões só com a hospedagem dos médicos cubanos durante o curso preparatório para atuar no programa Mais Médico. Na versão original divulgada pelo ministério, não havia gasto com hospedagem. Todos seriam alojados em unidades militares. O ministério alega que teve de reformular os planos porque as instalações não tinham espaço para o treinamento. Nesta terça-feira, a presidente Dilma Rousseff sanciona a lei que institui o programa Mais Médicos.

Segundo documentos obtidos pelo GLOBO com base na Lei de Acesso à Informação, o ministério alterou o plano de aplicação de recursos do Mais Médicos em setembro. Num ofício do dia 16, o secretário de Gestão do Trabalho, Mozart Sales, solicitou a alteração do plano. A versão até então divulgada pelo Ministério da Saúde previa que seriam gastos R$ 510, 9 milhões na primeira fase do Mais Médicos. Desses R$ 469 milhões iriam para pagamento dos profissionais e R$ 4 milhões para prestadores de serviços. Com a mudança, o valor destinado aos salários caiu para R$ 457 milhões. E o pagamento a pessoas jurídicas prestadoras de serviço ao programa subiu para R$ 16,073 milhões.

Lançado em julho deste ano, o programa criado para levar profissionais para regiões onde faltam médicos, já sofreu várias alterações desde que começou a ser discutido pelo governo. Os documentos obtidos pela Lei de Acesso mostram ainda a dança de números sobre a quantidade de médicos que o governo pretendia pôr em atuação. O projeto básico do Mais Médico dizia que a meta inicial era de 6.602 profissionais. O texto fala que seria justamente esse o contingente necessário para atender a população "sem plano de saúde" nas cidades mais necessitadas.

Depois, foi aberta chamada para as prefeituras e o número subiu para 16.625. Na semana passada, o ministério alegou que os pedidos das prefeituras eram exagerados e reduziu isso para 12 mil profissionais. Em resposta a questionamento do GLOBO, o Ministério da Saúde explicou que o programa não se restringiu às cidades prioritárias, o que elevou a demanda por médicos.

O programa teve outra mudança, no termo de cooperação técnica com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), por meio do qual foi possível trazer médicos cubanos ao Brasil. Um memorando de 20 de agosto de 2013, assinado pelo secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mozart Sales, pediu a retirada de uma cláusula, segundo a qual caberia à OPAS "garantir o pagamento de bolsas aos médicos participantes".

A cláusula inviabilizaria o acordo com o governo cubano, que é quem recebe os valores e depois repassa uma parte aos médicos. "O avanço das discussões culminou na decisão do governo federal de aplicar o modelo de remuneração do Ministério da Saúde à OPAS, que repassa os recursos ao Ministério da Saúde de Cuba", explicou a pasta depois de ser questionada a respeito pelo GLOBO. Já há 2.400 cubanos no Brasil, e estão previstos mais 1.600 em dezembro.

O Mais Médico foi instituído por uma medida provisória, que tem força de lei antes mesmo de ser aprovada pelo Congresso e sancionada pela presidente. Assim, já há médicos trabalhando por meio do programa. O Parlamento alterou alguns trechos do texto e o aprovou na semana passada, mas manteve o principal ponto do programa: a possibilidade de trazer médicos estrangeiros sem passar pelo exame de revalidação do diploma.

Entre as mudanças feitas pelo Congresso está a que transfere dos conselhos regionais de medicina (CRMs) para o Ministério da Saúde a concessão do registro profissional para os médicos formados no exterior. Como as entidades médicas são contrárias ao programa, os CRMs vinham criando entraves para conceder o registro, o que na prática impede que os médicos de fora trabalhem.

Dos 680 médicos formados no exterior selecionados na primeira etapa do programa, 196 ainda não têm registro. Com a sanção do texto pela presidente, o ministério poderá fazer isso diretamente, mas vai ter que esperar pelo menos mais um dia. A portaria regulamentando a concessão do registro deverá ser publicada apenas amanhã no Diário Oficial da União. Os 2.180 médicos de fora participantes da segunda etapa ainda estão tendo aulas preparatórias. Quando estiverem aptos para trabalhar, terão o registro concedido pelo próprio ministério.

(André de Souza e Francisco Leali/O Globo)