terça-feira, 19 de outubro de 2010

Para especialista em desigualdade, a chamada nova classe média é “fetiche do número”

Via Agência Brasil
Por Gilberto Costa
16.10.2010

Brasília – O próximo presidente da República governará um país que nos últimos anos assistiu à ascensão econômica de 30 milhões de pessoas. O feito tem sido registrado por pesquisas que avaliam que o Brasil tem agora uma “nova classe média”, segundo o diretor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Marcelo Neri.

A visão, no entanto, não é unânime. Para a economista Sônia Rocha, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), falar em nova classe média não é adequado porque o termo vai além do poder aquisitivo e também se refere a formas de comportamento. “Você pode dizer que as pessoas estão ganhando, estão subindo para uma classe de consumo mais elevada. renda e consumo, né? Falar em classe média envolve valores de educação, conhecimento, conservadorismo político. Mistura uma série de características que definitivamente não é o caso”, disse.

O pesquisador e professor titular de sociologia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Jessé Souza, que está lançando o livro Os Batalhadores Brasileiros, concorda com a economista e aponta que “o que se chama de nova classe média é uma espécie de nova classe trabalhadora, sem direitos e que trabalha de dez a 14 horas por dia - o que a permite consumir bens duráveis com grande esforço”, afirmou.

Para o pesquisador, esse segmento da população tem pouco volume de “capital cultural” (escolaridade e acesso a bens culturais) - “bem menor do que a classe média verdadeira”. Segundo o conceito, o “capital cultural” é incorporado desde o berço, permite melhor formação profissional e a ocupação dos melhores postos no mercado de trabalho.

Na opinião de Jessé Souza, há “muita celebração” sobre o suposto ingresso de brasileiros na classe média, isso, no entanto, é baseado no que classifica como “fetiche [fantasia] do número”. Para o professor, há “pouco cuidado científico e certa cegueira em relação ao continuado sofrimento e abandono que ainda marca o cotidiano de porção considerável da população brasileira”. Continua