quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Carlão, despojado, emociona

Via Estadão, há 482 dias sob censura
Por Luiz Zanin Oricchio/ BRASÍLIA
25.11.2010


Eu e minhas atrizes. Ecos da ditadura  impregnam
o filme, que iscila entre poesia, melodrama
 e momentos grotescos
 (Aline Arruda/Divulgação)
Na noite de abertura do 43º Festival de Brasília houve emoção. Não aquela emoção prêt-à-porter, de frases feitas e lágrimas convenientes, que infestam os festivais de cinema. Emoção legítima, improvisada, como não poderia deixar de ser quando o personagem em questão é ninguém menos que Carlos Reichenbach. "Carlão", como todo mundo o chama, é um dos mais importantes cineastas brasileiros em atividade, com extensa carreira de 33 longas-metragens. Mas não faz pose de diretor. Não faz pose de nada, às vezes para desespero de quem cultiva as aparências. Subiu ao palco com uma garrafa de água mineral na mão. "Como ele vai segurar o prêmio?", perguntam amigos do diretor.

Carlão deu um jeito. Recebeu o Candango - o prêmio tradicional do Festival de Brasília - , atrapalhou-se com a garrafa d"água e o microfone, e chamou ao palco sua trupe. Subiram as atrizes do seu filme Liliam M. Relatório Confidencial - Célia Olga Benvenutti, que interpreta a protagonista, Maracy Melo e sua mulher Lygia Reichenbach, que faz um pequeno papel; a produtora, parceira de tantos filmes, Sarah Silveira, e o montador de Liliam M., o crítico Inácio Araújo. Carlão falou muitas e boas coisas sobre o filme em si e o cinema de maneira geral. Mas o melhor estava por vir, no finalzinho da homenagem, quando todos já se preparavam para descer do palco do Teatro Nacional. Carlão pediu mais um minuto de tolerância à plateia e contou uma pequena história.

O caso é o seguinte. Liliam M. foi lançado em 1975. Um dia, Reichenbach recebe o telefonema do crítico Orlando Fassoni, muito influente na época. "Carlão, dê um jeito de ir para o Rio porque tenho informação de que a Célia Benvenutti ganhou a Coruja de Ouro." Cabe explicação: a Coruja de Ouro era, naquele tempo, o principal prêmio do cinema brasileiro, o Oscar do cinema nacional. Sem um tostão no bolso, Carlão e equipe deram um jeito e foram de carro para o Rio. A informação de Fassoni era furada. Não ganharam prêmio algum. "Nunca a Via Dutra me pareceu tão longa como naquela volta para São Paulo", lembra. Continua