Por Montserrat Martins
24.11.2010
Todos estudos científicos sobre comportamentos anti-sociais apontam que um dos fatores de previsão de reincidência é a falta de autocrítica. Quer dizer, quem prejudica aos outros com seus atos vai continuar fazendo isso se não sentir culpa, vergonha ou admitir que está errado e precisa rever sua conduta. Se isso é uma verdade inquestionável para as pessoas com personalidade anti-social, não seria diferente para as demais pessoas, mesmo que não recebam esse rótulo psiquiátrico.
Aliás, embora seja absolutamente “normal” o fato de que as pessoas habitualmente resistem a aceitar críticas, ou reconhecer erros, isso não significa que o fato de ser “normal” seja um fato positivo em si mesmo – principalmente quando seus atos, mesmo que não intencionalmente, sejam danosos aos demais.
Lembrei de uma expressão típica dos meus avós, que quando indignados com outras pessoas diziam “e nem ficam vermelhos”, no recente episódio envolvendo o Ministério da Educação e o Enem, quando li as declarações de que os problemas foram considerados “normais” e a solução seria fazer “vários exames por ano”. Qual a perspectiva de resolver os problemas ocorridos esse ano, se eles não causam indignação nas próprias autoridades responsáveis ?
Está na moda, politicamente correto, dizer que os governos tem de ser “republicanos”, o que inclui imparcialidade e isonomia de tratamento a todos setores da sociedade, sem distinção. Pois é exatamente isso que foi lesado com as falhas do Enem, a igualdade de oportunidades a todos os participantes. Se as provas vão ser refeitas apenas para alguns, como saber se elas serão mais fáceis ou difíceis do que as que serão validadas ? Onde a igualdade de condições, se grande parte dos próprios alunos estarão submetidos a um estresse extra por estarem fazendo a prova pela segunda vez ? E os que não conseguirem provar que deveriam ter direito a nova prova, haja visto os obstáculos burocráticos para o reconhecimento de que foram prejudicados ? No que resta o apelo ao Judiciário, acionado para garantir o direito de nova prova a todos prejudicados.
Mais do que a solução para todo esse “imbróglio”, preocupa a falta de iniciativas ou promessas de solução duradoura para previnir erros futuros, gerando uma grande incerteza na juventude. Aliás, pelo menos isso o Ministério da Educação conseguiu, unir os estudantes numa bandeira comum, há muito que não víamos movimentos de jovens nas ruas reinvindicando algo coletivo, em tempos de acomodação do movimento estudantil em relação aos governantes.
Montserrat Martins, colunista do EcoDebate, é Psquiatra